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A noite prolongada da Vigília Pascal

“Durante o ano litúrgico, a Igreja comemora, pela sequência dos tempos litúrgicos, os vários mistérios da Redenção que encontram na Páscoa a sua fonte e seu cumprimento. O evento pascal é fundante, centro da fé, da pregação, do querigma, de ação pastoral de nossas paróquias, grupos, movimentos, organismos pastorais e sociais.”
Jackson Erpen – Cidade do Vaticano

A Páscoa é a celebração fundamental do culto cristão, esta celebra a totalidade do mistério de Cristo que morreu, foi sepultado, ressuscitou e ascendeu ao céu. Dela tem origem todo o ano litúrgico. Por consequência, como recorda a Instrução Geral do Missal Romano, “a celebração da Missa, como ação de Cristo e do povo de Deus hierarquicamente ordenado, é o centro de toda a vida cristã, tanto para a Igreja, quer universal quer local, como para cada um dos fiéis. Nela culmina toda a ação pela qual Deus, em Cristo, santifica o mundo, bem como todo o culto pelo qual os homens, por meio de Cristo, Filho de Deus, no Espírito Santo, prestam adoração ao Pai”.
“A noite prolongada da Vigília Pascal” é o tema da reflexão do Pe. Gerson Schmidt*:
“Reafirmamos a beleza da liturgia pascal do tempo precioso até Pentecostes como uma única, intensa e prolongada liturgia, que ressoa da noite maravilhosa da Páscoa. É um eco de um sino retumbante que não para de tocar até atingir os corações com o eco do grito de Aleluia, proclamando a vitória de um tão grande Rei, como canta o Exultet (o Pregão Pascal), o cântico solene da Vigília da Páscoa. O mistério pascal que, como o sol atrai todos os astros, atrai toda a humanidade, toda a ação da Igreja, todas as outras celebrações menores, em todo o ciclo litúrgico, mesmo no tempo comum em que vivenciamos na liturgia.  

“O Batismo na Igreja primitiva acontecia numa piscina da regeneração, não numa pia ou bacia ajeitada. O neófito era enxertado da Páscoa do Senhor, para renascer pelo banho da …

 
Usemos outra comparação para falar da centralidade e retumbância do Mistério Pascal. Quando jogamos uma pedra num lago parado, se formam várias pequenas ondas subsequentes ao contato da pedra com a água. As pequenas ondas se formam a partir de um ponto central e principal: a pedra lançada no lago. Assim entendemos as outras eucaristias e liturgias diárias e semanais. São reflexos do evento maior que é a Páscoa, daquela pedra removida do Sepulcro, removida não necessariamente para Cristo poder ressuscitar, mas para que os apóstolos e os cristãos pudessem entrar e constatar, como anunciado pelos Anjos, que Ele não está mais ali entre os mortos, aquele que vive e vive para Sempre. Portanto, não morre mais. Sua Ressurreição é definitiva, uma vez por todas e para todo o sempre, pelos séculos dos séculos, como se retoma as palavras da renovação da nova edição do Missal Romano no Brasil. Na comparativa da pedra no lago, chega a um ponto em que as ondas são bem fracas e, de tal maneira, a Páscoa se renova todo ano, para causar novo impacto, reavivando nossa fé batismal, num impulso ainda maior e mais profundo. O ciclo litúrgico não se repete, mas se atualiza com um vigor ainda maior e mais intenso.
Recuperemos aqui o que já apontamos em outra ocasião do comentário nos cadernos do Concílio, de número 13 das Edições da CNBB, que descreve assim: “o Ano Litúrgico não é reprodução de um filme sobre acontecimentos do passado, mas a participação na história de Jesus mediante a comunhão com o Ressuscitado ao longo do tempo. Aqueles eventos que a Igreja nos faz celebrar todos os anos não são acontecimentos arquivados no baú da história, porque – como dizia São Leão Magno – “aquele dia não passou de tal maneira que também passasse a força interior na obra que então foi realizada pelo Senhor”. E santo Agostinho argumenta: “aquilo que aconteceu uma vez na realidade histórica, a solenidade litúrgica o celebra de modo recorrente e assim o renova no coração dos fiéis”. Essa Passagem e essa Páscoa Cristo quer realizar entre nós por meio dos diversos tempos litúrgicos em que vivemos, celebramos e neles ressuscitamos. A repetição dos ciclos litúrgicos não deve ser vista como “uma monotonia, como se fosse um eterno retorno dos mesmos eventos salvíficos, mas como uma abertura progressiva rumo ao eterno infinito de Deus”. São Leão Magno gostava de dizer que “no retorno cíclico de cada ano, o mistério da nossa salvação é reatualizado para nós: mistério que, prometido desde o início e finalmente levado a cumprimento, continuará sem nunca terminar”[1].
A Igreja, ao longo dos séculos, já tomou consciência do valor frontal do Mistério Pascal de Cristo, que se coloca no centro da experiência de fé e da celebração dos fiéis[2]. O mistério pascal é a fonte e o cume de todas as celebrações e ações litúrgicas. É o ponto nevrálgico, a coluna vertebral de toda a liturgia, a seiva que percorre toda a ramificação dos sacramentos, preces e celebrações. Durante o ano litúrgico, a Igreja comemora, pela sequência dos tempos litúrgicos, os vários mistérios da Redenção que encontram na Páscoa a sua fonte e seu cumprimento. O evento pascal é fundante, centro da fé, da pregação, do querigma, de ação pastoral de nossas paróquias, grupos, movimentos, organismos pastorais e sociais.
A Constituição Sacrosanctum Concilium afirma que “a santa mãe Igreja considera seu dever celebrar em determinados dias, no decorrer do ano, a sagrada memória da obra salvífica de seu Divino Esposo” (SC, 102). A Constituição usa a expressão “sacra recordatione celebrare” para significar que não se trata de uma simples lembrança psicológica, mas de uma celebração que atualiza o que é celebrado, pois durante o ano, ao recordar esses mistérios, a Igreja “abre as riquezas do poder santificador do seu Senhor, de maneira a se tornarem presentes em todos os tempos, para que os fiéis entre em contato com eles repletos da graça da salvação” (SC, 102). Portanto, não é uma memória qualquer, simples recordação histórica, de um evento de dois mil anos atrás, mas uma celebração e atualização sacra de um acontecimento ímpar que perpassa toda a história humana, pois Cristo, como inspira a oração da bênção do Círio Pascal do Sábado Santo, é o princípio, meio e fim da história salvífica.”
*Padre Gerson Schmidt foi ordenado em 2 de janeiro de 1993, em Estrela (RS). Além da Filosofia e Teologia, também é graduado em Jornalismo e é Mestre em Comunicação pela FAMECOS/PUCRS._________________________
[1] Cadernos do Concílio, Jubileu 2025, n.13. Os tempos fortes do Ano Litúrgico, Edições CNBB, p. 11.[2] Idem, p.10.

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