Connect with us

Notícias

Das trevas à luz: uma história de redenção de Nápoles

Nenhum lugar personifica os contrastes e as contradições de Nápoles como o bairro “Rione Sanità”, e é aqui que a Cooperativa La Paranza, apoiada pela Diocese e por fundos europeus, lançou um projeto sem precedentes para restaurar o patrimônio artístico e cultural. A ecologia cultural, o empreendedorismo social, a economia civil, bases da Laudato si’ e um bem-estar generativo que vem de baixo, estão mudando o destino desse bairro e de seu povo, especialmente os jovens.
Cecilia Seppia – Cidade do Vaticano
No número 109 da Via Santa Maria Antesaecula, no bairro “Rione Sanità”, nasceu o artista Totò e em frente à sua casa há sempre grande movimentação de fãs e turistas deixando flores e lembranças. Nas entranhas do bairro mais controverso de Nápoles, alguns metros abaixo do nível da rua, há uma enorme cidade subterrânea onde o sagrado encontra o profano e o Oriente encontra o Ocidente, com as Catacumbas de São Genaro e São Gaudioso e as Catacumbas menores de São Severo. Há também as basílicas de São Genaro Extra Moenia e a de Santa Maria da Saúde, que abriga a primeira representação mariana em Nápoles e obras preciosas, entre as quais pinturas de Luca Giordano, Andrea Vaccaro, Francesco Solimena, Pacecco De Rosa e Giovanni Balducci. Encontra-se também lá o ossuário Fontanelle, uma das pedreiras de onde antigamente se extraía o tufo para construir a cidade e, mais tarde, usado para abrigar os restos mortais das vítimas da peste (1656) e das epidemias de cólera (1836). Por fim, o Palácio dello Spagnuolo, com sua escadaria monumental, um dos principais exemplos do barroco napolitano, construído em 1738 com projeto do arquiteto Ferdinando Sanfelice. Apesar desse vasto patrimônio histórico e artístico, concentrado em apenas 2 quilômetros quadrados, quando as pessoas falam sobre o Rione Sanità, pensam imediatamente em degradação, na pobreza de seus 32.000 habitantes, na mão da Camorra (máfia local) por trás dos atos criminosos, no baixo nível de escolarização dos jovens, no desemprego. Isso acontece porque nenhum lugar incorpora as contradições e os contrastes de Nápoles como este Rione, uma periferia existencial em pleno centro da cidade, mas é exatamente nessas trevas que a Cooperativa La Paranza quis trazer luz, com o apoio da Igreja local, da Diocese e também de fundos europeus.

O bairro Sanità, no coração de Nápoles, incorpora todos os contrastes da cidade

Da degradação à recuperação de um patrimônio imenso e desconhecido
Já no ano 2000, a chegada do novo pároco da Basílica de Santa Maria della Sanità, Padre Antonio Loffredo, marcou o início de um processo lento, mas frutífero, de desenvolvimento e aprimoramento do patrimônio histórico, artístico e humano do bairro. De fato, com a ajuda de fundações, profissionais e associações, foi possível criar oportunidades de recuperação para os jovens, partindo do princípio de Dostoiévski de que “a beleza salva o mundo”, e padre Antonio acrescenta: “cria empregos e tira os jovens da rua”. Com a criatividade de um moleque típico local e a determinação de um dirigente, com a linguagem teatral de grandes atores napolitanos e a Igreja do Concílio às suas costas, padre Antonio fez renascer um dos bairros mais problemáticos de Nápoles com a intenção evangélica de “transformar pedras descartadas em pedras fundamentais”. Nascido em 1959, em seu terceiro “mandato” como pároco de Santa Maria da Saúde, ele conta que, quando chegou ao Rione, as outras dez igrejas, espalhadas pelo território da paróquia, estavam fechadas. Hoje, porém, as luzes estão acesas até tarde da noite. Uma abriga uma oficina de teatro, outra é a sede da orquestra juvenil Sanitansamble, as outras abrigam um ginásio de boxe, um estúdio musical, uma sede para crianças pós-escola, e a igreja menor exibe pinturas napolitanas do século XVII e O Filho Velado do escultor Jago, que tem sua oficina em outra igreja.
Bem-estar generativo que dá esperança
Em um fluxo contínuo entre o dialeto napolitano, citações eruditas e citações evangélicas, o pároco olha para além, mas tem os pés firmes no chão: “Para mim, como sacerdote, o problema não é colocar as igrejas em ordem, mas fazer com que essas coisas preciosas gerem, deem frutos”. E a capacidade de gerar são os mais de 60 jovens que trabalham com um contrato, que se autossustentam sem precisar pedir caridade a ninguém, são também as possibilidades de trabalho e a economia circular que chegou com a abertura do bairro. A base de todos os esforços foi a recuperação das catacumbas de São Genaro, a criação de um itinerário pelas entranhas da colina de Capodimonte até o bairro Sanità, na capela que já foi o depósito do hospital São Genaro e agora é um centro de arte e conferências. “Nós nos dedicamos muito à catacumba, porque nos apresentamos ao mundo de uma forma inédita coletando dinheiro limpo. Alguns dos jovens da orquestra se inscreveram no conservatório. Os do teatro saem em turnê, o bairro se tornou o cenário de várias produções cinematográficas, surgiram restaurantes e se estabeleceu um fluxo de turistas. Para nós, cristãos, isso deveria ser um dogma: ou o bem-estar é feito assim ou nada. Não precisamos mais daquele emaranhado assistencialismo do século XIX”, conclui Padre Antonio.

Além das visitas guiadas, as crianças da Cooperativa La Paranza também criaram oficinas

“La Paranza” entre cooperativa social e missão
Sua filosofia é clara. Não acredita no absoluto do Estado, que deve alimentar a todos, mas na tríplice colaboração: Estado, privado e sociedade civil, aquele terceiro setor que dá a liberdade de criar respostas, com uma economia real e com o homem no centro. E, nessa abertura de espírito, pode-se ouvir o eco da The Economy of Francesco, da Laudato si’, encarnado perfeitamente pelos jovens da Cooperativa La Paranza, fundada em 2006 no “Rione Sanità” que, com a ajuda do Padre Loffredo, decidiu redescobrir e valorizar o patrimônio cultural, artístico e arqueológico dessa parte esquecida de Nápoles. As primeiras atividades realizadas foram a gestão das Catacumbas de São Gaudioso na Basílica de Santa Maria da Saúde e a reforma do antigo convento franciscano anexo à basílica, cujo projeto de restauração da “Casa do Monacone” é do designer napolitano Riccardo Dalisi. Ao mesmo tempo, a cooperativa tem sido ativa na obtenção de financiamentos por meio de fundos privados e licitações. Vencendo a licitação histórico-artística “Fondazione Con il Sud” de 2008 num valor de 500 mil euros, foi desencadeado o processo de recuperação e abertura das Catacumbas de São Genaro ao público. Igualmente importante foi a atividade de arrecadação de fundos no valor de 600 mil euros em conjunto com a associação L’Altra Napoli onlus; financiamento que permitiu a limpeza e a acessibilidade do local, o sistema de iluminação, a restauração de afrescos, a reabertura de espaços inacessíveis, a eliminação de barreiras arquitetônicas e muito mais. Nas catacumbas, além da gestão normal das atividades de visitas guiadas dentro do sítio cultural, os jovens tiveram a intuição de organizar eventos e espetáculos específicos, a fim de dar um maior impulso em termos de comunicação e público-alvo, bem como economicamente. Além disso, eles estão ativamente envolvidos na promoção e na realização do itinerário “Il Miglio Sacro”, um percurso de uma milha para descobrir os tesouros do Rione Sanità.

Tesouros escondidos foram trazidos de volta à vida e agora estão abertos a todos para visitar

Alguns números
Ano após ano, o número de visitantes tem aumentado cada vez mais: de 5.160 visitantes em 2006 para 160.000 em 2019 e até 200.000 visitantes em 2022, tanto nacionais quanto internacionais, assim como aumentou a conscientização de que é preciso cuidar da Casa Comum, que também é uma arca de tesouros que enriquece os olhos e o coração. O número crescente de visitantes, atividades e volume de negócios também permitiu o aumento de novos recursos humanos na Cooperativa, que passou de 5 jovens em 2006 para 50 funcionários em 2023. De ano para ano, os funcionários são efetivados com contratos por tempo determinado ou como permanentes. Além das atividades relacionadas ao patrimônio histórico e artístico, há projetos de apoio à cultura e suas diversas formas: artes criativas, musicais, teatrais, artesanais, enogastronômicas, etc. A Fundação concentra suas atividades e recursos principalmente para as faixas da população menos protegidas e desfavorecidas, com uma série de atividades que também apoiam projetos de formação e colocação em empregos, de modo a permitir um processo de autodesenvolvimento local.

O bem-estar generativo traz trabalho e dignidade ao bairro Sanità, tirando muitas crianças das ruas

O testemunho de Vincenzo
Vincenzo Porzio, membro fundador e chefe de comunicações da Cooperativa La Paranza, relatou ao Vatican News e o L’Osservatore Romano com entusiasmo sua experiência, a mudança que viu com seus próprios olhos e o exemplo de compromisso, fortaleza e dedicação que os jovens do Rione demonstraram ao longo dos anos. “Primeiro São Francisco de Assis e agora o Papa Francisco”, afirma, “nos ensinaram e nos exortam constantemente a cuidar do nosso Planeta e a cuidar das pessoas que o habitam, especialmente as últimas, as frágeis, aquelas que estão esperando por uma mão estendida, e na Laudato si’ encontramos muitos aspectos do nosso trabalho que realizamos não apenas com palavras, mas com gestos e compromissos diários. Em particular, cuidamos do que o Papa chama de “ecologia da cultura e da vida em comum”, no sentido de comunidade, e assim nos comprometemos, na esteira das exortações contidas nesses textos, a cuidar das “pedras descartadas” para que se tornem “pedras fundamentais” em um sistema de bem-estar que não espera por uma ajuda vinda de cima, do Estado em particular, mas que age para conquistar sua própria dignidade e próprio bem-estar. Em tudo o que fazemos, somos movidos pelo coração, pela paixão, pelo desejo de fazer, de dar a nós mesmos, à nossa terra e às gerações futuras algo “limpo”, algo justo. É uma modalidade generativa, que está na base do nosso modo de ver as coisas, porque gera o bem, não visa à rentabilidade dos bens da Igreja, das catacumbas, dos cemitérios, das basílicas que a Igreja nos confiou, dando-nos as chaves desses lugares extraordinários e pouco conhecidos, mas visa à sua capacidade de gerar esperança, o desejo de cuidar, a beleza, e aqui no Rione Sanità de Nápoles precisávamos muito disso!”. Uma valorização que se torna evangelização e que testemunha com suas obras a revolução do Evangelho, que é, antes de tudo, revolução do amor, também para o ambiente em que vivemos. Por meio do extraordinário trabalho de valorização das Catacumbas de Nápoles, a cooperativa de jovens do Rione Sanità criou, ao longo dos anos, um modelo de “bem-estar generativo” capaz de oferecer, a partir da redescoberta do patrimônio cultural local, respostas concretas em termos de desenvolvimento de empregos e inclusão social dirigidas à comunidade local e, especialmente, aos seus jovens que pareciam não ter ideia de um futuro e que, agora, fazem planos, sonham e vivem a normalidade de sua idade em um contexto que é tudo, menos normal. Um modelo que também pode ser definido como um exemplo de promoção da cultura “a partir de baixo”, cujos pilares podem ser encontrados na tutela do patrimônio cultural, na cooperação e no desenvolvimento do empreendedorismo social e de uma economia civil, as pedras fundamentais da Laudato si’.

Continue Reading
Click to comment

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Notícias

O Papa: muitos conflitos abertos, não ceder à lógica das armas

Francisco divulgou uma carta por ocasião dos 80 anos do voto de Pio XII e da cidade de Roma a Maria Salus Populi Romani durante a fúria da II Guerra Mundial. O Pontífice pede que o aniversário seja uma oportunidade para “meditar em torno do terrível flagelo da guerra”. Olhando para a Ucrânia, Oriente Médio, Sudão e Mianmar, exorta a ouvir os “gritos de terror e de sofrimento” que questionam a consciência de todos e a “trabalhar pela paz na Europa e no mundo”.
Mariangela Jaguraba- Vatican News
O Papa Francisco enviou uma carta ao vice-gerente da Diocese de Roma, dom Baldassarre Reina, por ocasião dos 80 anos do voto de Pio XII e da cidade de Roma ao ícone de Nossa Senhora conhecido como “Salus Populi Romani” durante a II Guerra Mundial.
O Pontífice une-se espiritualmente a toda a comunidade diocesana que celebra pela primeira vez a memória litúrgica da Salus Populi Romani, e recorda o voto que o povo de Roma e seu Pastor, Papa Pio XII, fez a Nossa Senhora em 4 de junho de 1944 para implorar a salvação da cidade, quando o confronto direto entre o exército alemão e os aliados anglo-americanos estava prestes a acontecer”, escreve o Papa no texto.
“A devoção ao antigo ícone conservado na Basílica de Santa Maria Maior está viva há séculos no coração dos romanos, que recorriam a ele para fazer súplicas e invocações, especialmente durante pragas, desastres naturais e guerras”, escreve ainda Francisco. “Os eventos marcantes da vida religiosa e civil de Roma eram registrados em frente a essa imagem. Portanto, não é de surpreender que o povo romano desejou confiar-se mais uma vez a Maria Salus Populi Romani enquanto a Urbe vivia o pesadelo da devastação nazista”, ressalta ainda o Papa.

Pio XII com os cidadãos romanos após o bombardeio do bairro de São Lourenço

Não ceder à lógica das armas
De acordo com Francisco, “oitenta anos depois, a lembrança desse acontecimento tão cheio de significado quer ser uma ocasião para rezar por aqueles que perderam a vida na II Guerra Mundial e para fazer uma meditação renovada sobre o tremendo flagelo da guerra”.
Muitos conflitos em diferentes partes do mundo ainda estão abertos hoje. Penso em particular na martirizada Ucrânia, na Palestina e Israel, no Sudão e Mianmar, onde as armas ainda fazem barulho e mais sangue humano continua sendo derramado.

“Esses são dramas que afetam inúmeras vítimas inocentes, cujos gritos de terror e sofrimento questionam a consciência de todos: não podemos e não devemos ceder à lógica das armas!”

O apelo de Paulo VI à ONU
O Pontífice recorda que “vinte anos após o fim da II Guerra Mundial, em 1965, o Papa São Paulo VI, falando na ONU, perguntou: ‘Será que o mundo chegará a mudar a mentalidade particularista e bélica que até agora teceu grande parte de sua história?'” Segundo Francisco, “essa pergunta, que ainda aguarda uma resposta, estimula todos a trabalhar concretamente pela paz na Europa e em todo o mundo”.

“A paz é um dom de Deus que também deve encontrar hoje corações dispostos a acolhê-lo e trabalhar para serem construtores da reconciliação e testemunhas da esperança.”

Ser construtor de paz
Francisco espera “que as iniciativas promovidas para comemorar o voto popular à Mãe de Deus, nos quatro lugares que foram protagonistas daquele acontecimento, possam reavivar nos romanos a intenção de serem construtores de uma verdadeira paz em todos os lugares, relançando a fraternidade como condição essencial para recompor conflitos e hostilidade”. “Pode ser construtor de paz”, ressalta o Papa, “quem a possui dentro de si e, com coragem e mansidão, se compromete em criar vínculos, em estabelecer relações entre as pessoas, em apaziguar as tensões na família, no trabalho, na escola, entre os amigos”.
O Pontífice conclui a carta, pedindo a Nossa Senhora Medianeira para que “obtenha para toda a humanidade o dom da concórdia e da paz” e confia “todos os habitantes de Roma, especialmente os idosos, os doentes, as pessoas sozinhas e em dificuldade, à intercessão materna da Salus Populi Romani”.

Continue Reading

Notícias

Indonésia. Ilha de Flores ainda é uma “terra prometida” de vocações

“Em junho e julho estão programadas várias ordenações diaconais entre os vários institutos missionários. No domingo, 2 de junho, 48 foram ordenados diáconos Verbitas, que serão seguidos por outros 8 diáconos Carmelitas no dia 7 de junho, e 27 interdiocesanos (Dioceses de Maumere, Ende, Ruteng, Larantuka e Denpasar) no domingo, 9 de junho. A esses se seguirão as ordenações de cinco diáconos Camilianos no próximo dia 14 de julho, na festa de nosso fundador, São Camilo de Lellis”, conta Pe. Galvani
Vatican News

 

Em 1924 os vigários e prefeitos apostólicos encontraram-se pela primeira vez, para definir uma orientação comum sobre diversas questões da vida da Igreja e sobre a relação com as …

“Nesta época de final de ano letivo, estamos obtendo bons resultados vocacionais. Nós, Camilianos, tentamos nos manter em forma tanto quanto possível com muitas pequenas coisas boas para fazer, não apenas no campo vocacional, mas também com nossas iniciativas sociais e de caridade.”
É o que conta à agência missionária Fides o padre Luigi Galvani, pioneiro na Diocese de Maumere, na Indonésia, onde os Missionários Camilianos estão presentes em três dioceses com 4 seminários, dois centros sociais onde coordenam um programa de nutrição para 160 crianças pobres, apoio à distância para cerca de 20 estudantes merecedores, um projeto de “casas especiais” para libertar os doentes mentais de situações de opressão e, por fim, um modesto projeto de produção de água mineral e do sorvete “São Camilo”.
Ordenações diaconais entre os vários institutos missionários
“Em junho e julho – explica ele – estão programadas várias ordenações diaconais entre os vários institutos missionários. No domingo, 2 de junho, 48 foram ordenados diáconos Verbitas, que serão seguidos por outros 8 diáconos Carmelitas no dia 7 de junho, e 27 interdiocesanos (Dioceses de Maumere, Ende, Ruteng, Larantuka e Denpasar) no domingo, 9 de junho. A esses se seguirão as ordenações de cinco diáconos Camilianos no próximo dia 14 de julho, na festa de nosso fundador, São Camilo de Lellis”.
A mais católica das 17.000 ilhas do arquipélago indonésio

Em algumas áreas do país, que o Papa visitará em setembro, membros do clero local e de ordens religiosas masculinas e femininas moram por alguns dias em famílias católicas, …

“Nos próximos meses, haverá também as profissões religiosas de numerosos noviços e noviças dos vários institutos masculinos e femininos presentes na Diocese de Maumere, que, no momento, atingiram o número de 62 comunidades religiosas”.
“Todos esses resultados vocacionais encorajadores – conclui o missionário – certamente recompensam o empenho dos vários promotores, mas também são um testemunho da fé e do espírito missionário de centenas e centenas de famílias na ilha de Flores, que continua sendo a mais católica das 17.000 ilhas do arquipélago indonésio. Talvez seja também por isso que Flores é chamada de “terra prometida” de vocações.
(com Fides)

Continue Reading

Notícias

África Central, quando uma Porta Santa se abriu para o mundo

O Jubileu Extraordinário da Misericórdia, em 2015, foi aberto em um lugar sem precedentes, longe do coração cristão do mundo, a Basílica de São Pedro, mas dentro do coração do Papa Francisco, em Bangui. O cardeal Dieudonné Nzapalainga, então arcebispo da capital da África Central, revive aquele dia memorável e o significado benéfico que a visita do Pontífice produziu ao longo do tempo.
Maria Milvia Morciano e Jean Charles Putzolu – Vatican News
É tarde e a noite se prepara lentamente para chegar, tingindo o céu de rosa e dourado. A porta da Catedral de Notre-Dame em Bangui se abre, empurrada por duas mãos firmes. A figura de Francisco está de pé, vigorosa. Muitos anos se passaram desde aquele 29 de novembro de 2015, o primeiro dia do Advento e a data de início do Jubileu Extraordinário da Misericórdia, que foi inaugurado, antecipadamente, em um lugar igualmente extraordinário, na capital da África Central. Pela primeira vez na história, a abertura da Porta Santa não se realiza na Basílica de São Pedro, no túmulo do Apóstolo, no centro do mundo cristão, mas em um lugar remoto, para muitos desconhecido.
Capital espiritual
A África Central é um dos países mais sangrentos e divididos do mundo. O Papa o escolheu justamente por esse motivo, para levar misericórdia e uma mensagem de paz a uma “terra que está sofrendo há vários anos com a guerra e o ódio, a incompreensão e a falta de paz. Mas nessa terra sofrida há também todos os países que estão passando através da cruz da guerra. Bangui se torna a capital espiritual da oração pela misericórdia do Pai. Todos nós pedimos paz, misericórdia, reconciliação, perdão, amor. Por Bangui, por toda a República Centro-Africana, por todo o mundo, pelos países que estão sofrendo com a guerra, pedimos paz!”, disse o Papa na praça da igreja, depois de sair de um papamóvel, desprovido de qualquer proteção contra possíveis perigos, onde o imã também concordou em se sentar.
Um gesto universal compreendido por todos
Uma tradição antiga é transferida para um país jovem. O significado de abrir a Porta Santa e cruzar o limiar está enraizado em um simbolismo ancestral que, em Bangui, se ramifica e dá novos frutos. Ele está revestido de futuro. O gesto do Papa Francisco foi revolucionário porque, em um lugar fechado, cheio de barreiras, ele abre uma porta para a esperança, convida as pessoas a entrarem para encontrar misericórdia e paz, para encontrar Cristo e serem transformadas. Ele traduz de forma cristã uma metáfora compreensível para todos, em qualquer lugar do mundo, de qualquer tradição, religião, experiência e história. Todos entendem que se trata de um rito de passagem fundamental e sagrado.
A linha de fronteira, o limes latim, ponto final, fechamento, é transformada em limen, limiar, abertura. Talvez não seja coincidência o fato de duas palavras opostas conterem a mesma raiz, mas é interessante lembrar o fato de que, na linguagem eclesiástica, a “visitatio ad limina apostolorum” é a visita dos peregrinos aos túmulos dos apóstolos Pedro e Paulo, que remonta aos primeiros séculos da Igreja, mais tarde estendida aos bispos. Tudo fala de Jubileu.
Portas Santas em toda parte
Naquele ano de Misericórdia, muitas Portas Santas foram abertas em todo o mundo, quase um sistema solar composto por milhares de estrelas brilhantes espalhadas pela Terra, mesmo nos lugares mais remotos. Foi uma grande oportunidade, um presente dado a todos, mesmo àqueles que, por vários motivos, não podiam se locomover e viajar. Foi um jubileu extraordinário que pôde ser vivenciado em todas as igrejas locais, permitindo que aqueles que quisessem vivenciar plenamente o evento, fazer a peregrinação e atravessar a Porta da Misericórdia em sua própria diocese.
Uma esperança que vem de Roma
O cardeal Dieudonné Nzapalainga, então arcebispo de Bangui, é um dos intérpretes nodais de seu país. Sua história é de fé e de uma árdua “luta pela paz”, lembrando o título de seu livro na versão italiana, publicado pela Livraria Editora Vaticana em 2022. O cardeal centro-africano compartilhou com a mídia vaticana, aos microfones de Jean Charles Putzolu, a memória daqueles dias e as consequências benéficas da visita do Papa à África Central.
Gostaria de levá-los de volta ao dia 29 de novembro de 2015, o primeiro domingo do Advento, quando o Papa Francisco abriu a Porta Santa do Jubileu da Misericórdia. Foi em Bangui, na República Centro-Africana, portanto, em seu país: uma tradição muito antiga chegando a um país jovem. Em sua opinião, qual foi o significado desse gesto para todos os centro-africanos?
É um gesto único na história não apenas da Igreja universal, mas também da nossa Igreja.
Porque nós, centro-africanos, diante da violência, do sofrimento e da morte, encontrando-nos vivendo em um estado de absurdo, sentimos a esperança que veio de Roma por meio do homem de Deus, o Papa, que veio para aplacar, para trazer paz, tranquilidade e perdão, para trazer reconciliação, convidando nós, centro-africanos, a abrir as portas de nossos corações, cheios de ódio, rancor e vingança, para que pudéssemos nos enfrentar. É por isso que ele mesmo disse para depormos nossas armas: “leve a justiça, leve o amor”. Acredito que seu gesto será sempre lembrado aqui na República Centro-Africana. Muçulmanos, protestantes, católicos, todos nós somos unânimes em dizer que sua chegada foi salutar.
E o Papa de fato chegou. Ela se lembrou dessa mensagem, desse chamado para depor as armas. Havia uma enorme tensão até quase dois dias antes de sua chegada a Bangui. Houve mais tensão desde então? Essa mensagem foi ouvida? A mensagem do Papa foi ouvida e atendida? As armas ficaram em silêncio?
Acho que a mensagem foi ouvida. Passamos seis meses desde a partida do Papa como se estivéssemos em um país normal, algo impensável até dois dias antes de sua chegada. Sua chegada aliviou a pressão. Vimos muçulmanos saindo de seus enclaves para se juntarem a seus irmãos e irmãs católicos no estádio, para participar da grande celebração. As pessoas iam e vinham. O Km 5 [marco 5] era considerado um local onde havia muitas armas e, portanto, não se podia entrar. Mas fui até lá com os cristãos para acompanhar o Papa, dizendo aos muçulmanos: “vamos caminhar juntos!”
O Papa veio de Roma para a República Centro-Africana, os cristãos de Bangui deixaram nossos bairros para ir ao encontro de nossos irmãos, caminhando pela paz. Bem, nós marchamos e continuamos a fazê-lo desde aquele dia. Um líder rebelde nos disse que deveríamos conversar sobre espiritualidade com os imãs. Os imãs organizaram uma grande reunião para pedir aos líderes rebeldes que depusessem suas armas e muita coisa mudou desde então. Isso também foi resultado da visita do Papa.
Os imãs realizaram um grande encontro para pedir aos líderes rebeldes que deponham as armas e isso mudou muito. Esse também foi o resultado da visita do Papa, que nos deu um empurrão, nos fez recomeçar e agora estamos vendo os resultados. Hoje as armas não circulam mais como antes.
Em sua opinião, quais foram os outros frutos desse evento?
Foram os encontros entre jovens muçulmanos e jovens cristãos. Encontros bastante regulares entre mulheres muçulmanas e mulheres cristãs, e entre nós, líderes. Há pouco tempo, em março, uma mesquita a 250 quilômetros daqui foi vandalizada. O imã, o pastor protestante e eu falamos ao coração de nossos fiéis para desarmá-los e convidá-los a cooperar, respeitar, valorizar e respeitar o local. Esse, em minha opinião, é o fruto dessa passagem. Agora também pedimos que a justiça seja feita. Isso significa que aqueles que perderam suas casas devem poder recuperá-las, o que significa que aqueles que moram na casa do vizinho há muito tempo devem ter a gentileza de sair. E nós, líderes religiosos, trabalhamos com o coração. Há alguns que saem para deixar a casa para os proprietários sem passar pelos tribunais ou pelo Estado. Portanto, acho que isso também é proveitoso. Agora os corações estão dispostos e podemos conversar, podemos imaginar um futuro comum.
Quando o senhor diz que eles saem de casa, é porque eles realmente a devolvem ao seu legítimo proprietário, certo?
Exatamente isso.
Em um nível mais pessoal, Vossa Eminência, quais são suas lembranças mais fortes e talvez mais vívidas daquele período?
A lembrança mais vívida é a de entrar no quilômetro 5 dois dias antes: era impossível atravessar o posto de controle. Eu estava lá. Vi com meus próprios olhos: o Papa escolheu ir em um veículo não blindado, mas em campo aberto. Todos sabiam que havia muitas armas no local. Francisco teve a coragem de ir até lá e vimos que o imã também concordou em ir no papamóvel. Essa é a imagem mais forte. Quando saí para ir ao estádio, vi muçulmanos saindo em massa, arriscando suas vidas. Foi sua fé que os levou a sair. Um imã nos disse: ‘O Papa não veio para vocês, cristãos, mas para nós, muçulmanos. Estávamos no enclave, estávamos na escravidão. Ele nos libertou!”
Eminência, uma última pergunta: o senhor se tornou inseparável do Imã… entre cristãos e muçulmanos e também com os protestantes. Vocês realizam iniciativas juntos quase diariamente. Esse é outro fruto. É claro que é o resultado de seu trabalho, mas também é o resultado da visita do Papa…
A visita do papa nos confortou, incentivou e apoiou nesse trabalho. E fomos nós três que pedimos a ele que viesse à República Centro-Africana. Acho que todos nós somos gratos a ele. Esse é o fruto de sua passagem.
O Jubileu de 2025. Como estão se preparando para ele?
O Jubileu de 2025 é um momento importante para a Igreja. Bem, já estão sendo criados grupos aqui para refletir, orar, reunir-se e também para ver como, localmente, viveremos esse momento. Este ano celebraremos 130 anos de evangelização na República Centro-Africana e, ao mesmo tempo, estaremos caminhando para 2025, que está logo ali, e estamos trabalhando em ambos. Portanto, acho que há muito entusiasmo. Eu estava com um grupo de jovens que se encontrava na igreja em massa e dissemos uns aos outros: este é um momento importante porque é um momento de graça, mas também é um momento complicado e elevado. Não podemos deixar passar esse momento favorável.

O cardeal Dieudonné Nzapalainga

Continue Reading

Mais Vistos

Copyright © 2024 - Caminho Divino