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Padre José Otácio encerra serviço como reitor do Pio Brasileiro, em Roma

Pio Brasileiro, “através do estudo, acolher esse momento novo que está sendo proposto na Igreja”. Entrevista com o padre Otácio Oliveira Guedes.
Padre Modino – Vatican News
O padre José Otácio Oliveira Guedes está encerrando seu serviço como reitor do Colégio Pio Brasileiro em Roma, iniciado em 2020, um tempo em que considera que o passo mais importante foi “criar um ambiente leve, fraterno, no Colégio, os padres sentirem-se no Colégio como numa casa de irmãos”. Ele deu continuidade a uma longa história, dado que o Pio Brasileiro acaba de completar 90 anos. Nesta entrevista, ele nos explica o que é vivenciado nesse pedacinho do Brasil em Roma.
Está encerrando um serviço que a Igreja do Brasil lhe pediu nos últimos quatro anos. Como avalia o tempo que o senhor foi reitor do Colégio Pio Brasileiro em Roma?
O Colégio desde a mudança de gestão dos Jesuítas para a CNBB em 2014, o desafio é a manutenção do Colégio, a questão financeira, mas dadas as circunstâncias também da pandemia, um outro desafio que se tornou foi o número de estudantes. Nós conseguimos dar passos, porque o simples fato de ter passado dos Jesuítas para a CNBB, não quer dizer que os bispos tenham tomado no início o colégio como próprio, o que a gente sente já agora.
Nessa Assembleia foi encaminhado a decisão da Igreja no Brasil fazer um fundo de manutenção do Colégio, dado que o sistema de bolsas, a dependência de organismos internacionais tem caído. Esse foi um passo importante, os bispos darem se conta de que o Colégio é deles, e o outro concomitante é que eles têm sido muito sensíveis a enviar sacerdotes. O ano passado, os bispos enviaram 44 novos padres, de um número em torno de 50 no período da pandemia, passamos a 91 no ano académico 2023-2024.
Internamente, o passo dado mais importante foi criar um ambiente leve, fraterno, no Colégio, os padres sentirem-se no Colégio como numa casa de irmãos. Não é que fosse assim, mas pode se sentir como um hotel, uma hospedaria, mas os padres sentem como uma casa de padres, aberta a outros irmãos que lá chegam. Não é somente os habitantes, mas temos sempre hóspedes, o que internamente é uma avaliação positiva.
O Colégio Pio Brasileiro acaba de completar 90 anos de ser, em palavras do Papa João Paulo II, um pedacinho do Brasil em Roma, onde tem se formado um bom número daqueles que têm sido os bispos do Brasil nesses 90 anos. O que tem significado esses 90 anos para a Igreja do Brasil?
O Colégio acabou se tornando uma referência da preparação académica dos formadores aqui. São um bom grupo de bispos nessa história, mais de 170 bispos, mas muitos professores universitários, muitos assessores nos diversos regionais, são qualificados. Temos boas universidades no Brasil, mas é bom essa abertura, para não cair no problema da endogenia, todo mundo formado no mesmo lugar, pensando as mesmas coisas, Roma permite esse universalismo.
Nesses 90 anos deu uma contribuição importante, e a Igreja ainda continua vendo como uma vocação importante do Colégio, dado que o cardeal Parolin, ele enviou uma carta ao presidente da CNBB, então dom Walmor, dizendo da importância de continuar formando os padres lá em Roma. O Colégio em seus 90 anos tem cumprido essa missão e tem futuro ainda para manter essa vocação do Colégio.
O Pío Brasileiro foi recebido pelo Papa Francisco recentemente, o que mais lhe impressionou desse encontro com o Santo Padre?
A proximidade do Papa. Comumente o Papa, ele disse ao longo do seu pontificado aos padres, batendo no clericalismo e outras posturas nossas pouco evangélicas. Uma árvore quando se balança para cair frutos podres, e o Papa fez muito isso, nesse encontro a percepção foi que o Papa é aquele pai sério e afável. Inclusive ele, em vez de um discurso, abriu para perguntas, e nos disse: “fazei-me perguntas corajosas”. Isso é de alguém que está ali como parceiro da nossa missão, um pai justo, eu me recordo do bispo que me ordenou, dom Carlos Alberto Navarro, então me fez pensar nele, justo, correto, um homem seguro, sem moleza, mas ao mesmo tempo próximo. Esse encontro do dia 4 de abril foi maravilhoso com o Papa.
A Assembleia da CNBB tem aprofundado na elaboração das Diretrizes para a Ação Evangelizadora da Igreja, onde a formação e formar os outros é fundamental. Como os estudantes do Pio Brasileiro contribuem nessa dimensão na Igreja do Brasil?
Essas diretrizes, quem está à frente do Colégio tem que fazer ressoar lá também, porque nós que estamos lá, estamos muito em sintonia. A gente participa do processo da Igreja do Brasil, esse pedacinho do Brasil em Roma é uma expressão da Igreja em Roma. Nós sentimos, e essa imagem da tenda que foi escolhida como metáfora do Sínodo, mas que dará um tom às nossas diretrizes, essa imagem da mobilidade, nossos padres que estão se preparando em Roma, eles estão procurando essa sensibilidade do momento presente, haja vista a proximidade com o Papa, um dos aspectos que mais se destaca na estadia lá em Roma. Os padres contribuem seja acolhendo esse espírito, seja também acolhendo a proximidade com o Papa e voltando para o Brasil, puderem enriquecer também aqui.
As Diretrizes para a Ação Evangelizadora estão em sintonia com a sinodalidade. Tem quem diz que os padres somos quem mais dificuldade temos com a sinodalidade. Como está sendo cultivada essa sinodalidade no Pio Brasileiro?
Essa desconstrução do clericalismo, porque o clericalismo, como alguém já disse, não está tanto no coleto que usa, mas na cabeça que tem. Essa proximidade com o Papa, essa escuta do Papa Francisco auxilia. Depois nós que estamos na direção, agora também com a chegada de dom Armando Bucciol, que é um bispo bem inserido na CNBB, leva este espírito para que esta sinodalidade possa ser vivida.
Esta sensibilidade do Papa acolhida lá em Roma ajuda a vivenciar. E essa dificuldade que nós temos, ela se deve mais por ignorância do que realmente quer dizer nesse momento da Igreja, do que por motivos teóricos e doutrinários. Ignorância ou medo em nossas inseguranças, de qual seria nosso lugar na Igreja, falando mais do genérico dos padres. Agora, se nós sentimos que dentro do povo fiel de Deus, como diz o Papa Francisco, a gente não precisa estar procurando cadeira porque tem espaço para todo mundo, é uma tenda muito larga e a gente não vai ficar precisando defender espaços de poder.
No Pio, são importantes a figura do reitor e do diretor espiritual para dar esse tom de proximidade com o Papa e com esse momento sinodal da Igreja. Feito isso, os padres também vão colhendo um pouco por osmose esse espírito novo que propõe a Igreja, que não tem que ter medo do Evangelho. O Evangelho não vai tirar nada da gente, se vai tirar alguma coisa é aquilo que deve ser tirado mesmo, aquelas cascas, aquela sujeira que a gente vê naqueles edifícios antigos de mármore de Roma, que precisa dar uma lavada. O Pio Brasileiro, a contribuição dele, a principal, é através do estudo, acolher esse momento novo que está sendo proposto na Igreja, teológico até, através do pontificado do Papa Francisco.
De volta ao Brasil, como pretende continuar colaborando, primeiro com sua diocese de Niterói, e depois com a Igreja do Brasil?
Como estive como missionário em Porto Velho antes de ir para Roma nessa missão de reitor, eu sinto muita falta dessa dimensão pastoral. Venho com total disponibilidade, mas a minha colaboração, ela será de voltar para um ambiente de paróquia, esse é o desejado, espero que seja isso também como o bispo me encaminha. Mas volto também para o ambiente acadêmico, tenho que voltar a lecionar na Pontifícia Universidade Católica do Rio e devo auxiliar também na direção espiritual dos seminaristas da minha diocese, no intuito de colaborar na formação dos futuros sacerdotes.
Não tenho ainda uma missão toda delineada, estou retornando com o coração bem disponível, mas desejoso de que a vontade de Deus através da Igreja seja a experiência de uma paróquia.

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O Papa: muitos conflitos abertos, não ceder à lógica das armas

Francisco divulgou uma carta por ocasião dos 80 anos do voto de Pio XII e da cidade de Roma a Maria Salus Populi Romani durante a fúria da II Guerra Mundial. O Pontífice pede que o aniversário seja uma oportunidade para “meditar em torno do terrível flagelo da guerra”. Olhando para a Ucrânia, Oriente Médio, Sudão e Mianmar, exorta a ouvir os “gritos de terror e de sofrimento” que questionam a consciência de todos e a “trabalhar pela paz na Europa e no mundo”.
Mariangela Jaguraba- Vatican News
O Papa Francisco enviou uma carta ao vice-gerente da Diocese de Roma, dom Baldassarre Reina, por ocasião dos 80 anos do voto de Pio XII e da cidade de Roma ao ícone de Nossa Senhora conhecido como “Salus Populi Romani” durante a II Guerra Mundial.
O Pontífice une-se espiritualmente a toda a comunidade diocesana que celebra pela primeira vez a memória litúrgica da Salus Populi Romani, e recorda o voto que o povo de Roma e seu Pastor, Papa Pio XII, fez a Nossa Senhora em 4 de junho de 1944 para implorar a salvação da cidade, quando o confronto direto entre o exército alemão e os aliados anglo-americanos estava prestes a acontecer”, escreve o Papa no texto.
“A devoção ao antigo ícone conservado na Basílica de Santa Maria Maior está viva há séculos no coração dos romanos, que recorriam a ele para fazer súplicas e invocações, especialmente durante pragas, desastres naturais e guerras”, escreve ainda Francisco. “Os eventos marcantes da vida religiosa e civil de Roma eram registrados em frente a essa imagem. Portanto, não é de surpreender que o povo romano desejou confiar-se mais uma vez a Maria Salus Populi Romani enquanto a Urbe vivia o pesadelo da devastação nazista”, ressalta ainda o Papa.

Pio XII com os cidadãos romanos após o bombardeio do bairro de São Lourenço

Não ceder à lógica das armas
De acordo com Francisco, “oitenta anos depois, a lembrança desse acontecimento tão cheio de significado quer ser uma ocasião para rezar por aqueles que perderam a vida na II Guerra Mundial e para fazer uma meditação renovada sobre o tremendo flagelo da guerra”.
Muitos conflitos em diferentes partes do mundo ainda estão abertos hoje. Penso em particular na martirizada Ucrânia, na Palestina e Israel, no Sudão e Mianmar, onde as armas ainda fazem barulho e mais sangue humano continua sendo derramado.

“Esses são dramas que afetam inúmeras vítimas inocentes, cujos gritos de terror e sofrimento questionam a consciência de todos: não podemos e não devemos ceder à lógica das armas!”

O apelo de Paulo VI à ONU
O Pontífice recorda que “vinte anos após o fim da II Guerra Mundial, em 1965, o Papa São Paulo VI, falando na ONU, perguntou: ‘Será que o mundo chegará a mudar a mentalidade particularista e bélica que até agora teceu grande parte de sua história?'” Segundo Francisco, “essa pergunta, que ainda aguarda uma resposta, estimula todos a trabalhar concretamente pela paz na Europa e em todo o mundo”.

“A paz é um dom de Deus que também deve encontrar hoje corações dispostos a acolhê-lo e trabalhar para serem construtores da reconciliação e testemunhas da esperança.”

Ser construtor de paz
Francisco espera “que as iniciativas promovidas para comemorar o voto popular à Mãe de Deus, nos quatro lugares que foram protagonistas daquele acontecimento, possam reavivar nos romanos a intenção de serem construtores de uma verdadeira paz em todos os lugares, relançando a fraternidade como condição essencial para recompor conflitos e hostilidade”. “Pode ser construtor de paz”, ressalta o Papa, “quem a possui dentro de si e, com coragem e mansidão, se compromete em criar vínculos, em estabelecer relações entre as pessoas, em apaziguar as tensões na família, no trabalho, na escola, entre os amigos”.
O Pontífice conclui a carta, pedindo a Nossa Senhora Medianeira para que “obtenha para toda a humanidade o dom da concórdia e da paz” e confia “todos os habitantes de Roma, especialmente os idosos, os doentes, as pessoas sozinhas e em dificuldade, à intercessão materna da Salus Populi Romani”.

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Indonésia. Ilha de Flores ainda é uma “terra prometida” de vocações

“Em junho e julho estão programadas várias ordenações diaconais entre os vários institutos missionários. No domingo, 2 de junho, 48 foram ordenados diáconos Verbitas, que serão seguidos por outros 8 diáconos Carmelitas no dia 7 de junho, e 27 interdiocesanos (Dioceses de Maumere, Ende, Ruteng, Larantuka e Denpasar) no domingo, 9 de junho. A esses se seguirão as ordenações de cinco diáconos Camilianos no próximo dia 14 de julho, na festa de nosso fundador, São Camilo de Lellis”, conta Pe. Galvani
Vatican News

 

Em 1924 os vigários e prefeitos apostólicos encontraram-se pela primeira vez, para definir uma orientação comum sobre diversas questões da vida da Igreja e sobre a relação com as …

“Nesta época de final de ano letivo, estamos obtendo bons resultados vocacionais. Nós, Camilianos, tentamos nos manter em forma tanto quanto possível com muitas pequenas coisas boas para fazer, não apenas no campo vocacional, mas também com nossas iniciativas sociais e de caridade.”
É o que conta à agência missionária Fides o padre Luigi Galvani, pioneiro na Diocese de Maumere, na Indonésia, onde os Missionários Camilianos estão presentes em três dioceses com 4 seminários, dois centros sociais onde coordenam um programa de nutrição para 160 crianças pobres, apoio à distância para cerca de 20 estudantes merecedores, um projeto de “casas especiais” para libertar os doentes mentais de situações de opressão e, por fim, um modesto projeto de produção de água mineral e do sorvete “São Camilo”.
Ordenações diaconais entre os vários institutos missionários
“Em junho e julho – explica ele – estão programadas várias ordenações diaconais entre os vários institutos missionários. No domingo, 2 de junho, 48 foram ordenados diáconos Verbitas, que serão seguidos por outros 8 diáconos Carmelitas no dia 7 de junho, e 27 interdiocesanos (Dioceses de Maumere, Ende, Ruteng, Larantuka e Denpasar) no domingo, 9 de junho. A esses se seguirão as ordenações de cinco diáconos Camilianos no próximo dia 14 de julho, na festa de nosso fundador, São Camilo de Lellis”.
A mais católica das 17.000 ilhas do arquipélago indonésio

Em algumas áreas do país, que o Papa visitará em setembro, membros do clero local e de ordens religiosas masculinas e femininas moram por alguns dias em famílias católicas, …

“Nos próximos meses, haverá também as profissões religiosas de numerosos noviços e noviças dos vários institutos masculinos e femininos presentes na Diocese de Maumere, que, no momento, atingiram o número de 62 comunidades religiosas”.
“Todos esses resultados vocacionais encorajadores – conclui o missionário – certamente recompensam o empenho dos vários promotores, mas também são um testemunho da fé e do espírito missionário de centenas e centenas de famílias na ilha de Flores, que continua sendo a mais católica das 17.000 ilhas do arquipélago indonésio. Talvez seja também por isso que Flores é chamada de “terra prometida” de vocações.
(com Fides)

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África Central, quando uma Porta Santa se abriu para o mundo

O Jubileu Extraordinário da Misericórdia, em 2015, foi aberto em um lugar sem precedentes, longe do coração cristão do mundo, a Basílica de São Pedro, mas dentro do coração do Papa Francisco, em Bangui. O cardeal Dieudonné Nzapalainga, então arcebispo da capital da África Central, revive aquele dia memorável e o significado benéfico que a visita do Pontífice produziu ao longo do tempo.
Maria Milvia Morciano e Jean Charles Putzolu – Vatican News
É tarde e a noite se prepara lentamente para chegar, tingindo o céu de rosa e dourado. A porta da Catedral de Notre-Dame em Bangui se abre, empurrada por duas mãos firmes. A figura de Francisco está de pé, vigorosa. Muitos anos se passaram desde aquele 29 de novembro de 2015, o primeiro dia do Advento e a data de início do Jubileu Extraordinário da Misericórdia, que foi inaugurado, antecipadamente, em um lugar igualmente extraordinário, na capital da África Central. Pela primeira vez na história, a abertura da Porta Santa não se realiza na Basílica de São Pedro, no túmulo do Apóstolo, no centro do mundo cristão, mas em um lugar remoto, para muitos desconhecido.
Capital espiritual
A África Central é um dos países mais sangrentos e divididos do mundo. O Papa o escolheu justamente por esse motivo, para levar misericórdia e uma mensagem de paz a uma “terra que está sofrendo há vários anos com a guerra e o ódio, a incompreensão e a falta de paz. Mas nessa terra sofrida há também todos os países que estão passando através da cruz da guerra. Bangui se torna a capital espiritual da oração pela misericórdia do Pai. Todos nós pedimos paz, misericórdia, reconciliação, perdão, amor. Por Bangui, por toda a República Centro-Africana, por todo o mundo, pelos países que estão sofrendo com a guerra, pedimos paz!”, disse o Papa na praça da igreja, depois de sair de um papamóvel, desprovido de qualquer proteção contra possíveis perigos, onde o imã também concordou em se sentar.
Um gesto universal compreendido por todos
Uma tradição antiga é transferida para um país jovem. O significado de abrir a Porta Santa e cruzar o limiar está enraizado em um simbolismo ancestral que, em Bangui, se ramifica e dá novos frutos. Ele está revestido de futuro. O gesto do Papa Francisco foi revolucionário porque, em um lugar fechado, cheio de barreiras, ele abre uma porta para a esperança, convida as pessoas a entrarem para encontrar misericórdia e paz, para encontrar Cristo e serem transformadas. Ele traduz de forma cristã uma metáfora compreensível para todos, em qualquer lugar do mundo, de qualquer tradição, religião, experiência e história. Todos entendem que se trata de um rito de passagem fundamental e sagrado.
A linha de fronteira, o limes latim, ponto final, fechamento, é transformada em limen, limiar, abertura. Talvez não seja coincidência o fato de duas palavras opostas conterem a mesma raiz, mas é interessante lembrar o fato de que, na linguagem eclesiástica, a “visitatio ad limina apostolorum” é a visita dos peregrinos aos túmulos dos apóstolos Pedro e Paulo, que remonta aos primeiros séculos da Igreja, mais tarde estendida aos bispos. Tudo fala de Jubileu.
Portas Santas em toda parte
Naquele ano de Misericórdia, muitas Portas Santas foram abertas em todo o mundo, quase um sistema solar composto por milhares de estrelas brilhantes espalhadas pela Terra, mesmo nos lugares mais remotos. Foi uma grande oportunidade, um presente dado a todos, mesmo àqueles que, por vários motivos, não podiam se locomover e viajar. Foi um jubileu extraordinário que pôde ser vivenciado em todas as igrejas locais, permitindo que aqueles que quisessem vivenciar plenamente o evento, fazer a peregrinação e atravessar a Porta da Misericórdia em sua própria diocese.
Uma esperança que vem de Roma
O cardeal Dieudonné Nzapalainga, então arcebispo de Bangui, é um dos intérpretes nodais de seu país. Sua história é de fé e de uma árdua “luta pela paz”, lembrando o título de seu livro na versão italiana, publicado pela Livraria Editora Vaticana em 2022. O cardeal centro-africano compartilhou com a mídia vaticana, aos microfones de Jean Charles Putzolu, a memória daqueles dias e as consequências benéficas da visita do Papa à África Central.
Gostaria de levá-los de volta ao dia 29 de novembro de 2015, o primeiro domingo do Advento, quando o Papa Francisco abriu a Porta Santa do Jubileu da Misericórdia. Foi em Bangui, na República Centro-Africana, portanto, em seu país: uma tradição muito antiga chegando a um país jovem. Em sua opinião, qual foi o significado desse gesto para todos os centro-africanos?
É um gesto único na história não apenas da Igreja universal, mas também da nossa Igreja.
Porque nós, centro-africanos, diante da violência, do sofrimento e da morte, encontrando-nos vivendo em um estado de absurdo, sentimos a esperança que veio de Roma por meio do homem de Deus, o Papa, que veio para aplacar, para trazer paz, tranquilidade e perdão, para trazer reconciliação, convidando nós, centro-africanos, a abrir as portas de nossos corações, cheios de ódio, rancor e vingança, para que pudéssemos nos enfrentar. É por isso que ele mesmo disse para depormos nossas armas: “leve a justiça, leve o amor”. Acredito que seu gesto será sempre lembrado aqui na República Centro-Africana. Muçulmanos, protestantes, católicos, todos nós somos unânimes em dizer que sua chegada foi salutar.
E o Papa de fato chegou. Ela se lembrou dessa mensagem, desse chamado para depor as armas. Havia uma enorme tensão até quase dois dias antes de sua chegada a Bangui. Houve mais tensão desde então? Essa mensagem foi ouvida? A mensagem do Papa foi ouvida e atendida? As armas ficaram em silêncio?
Acho que a mensagem foi ouvida. Passamos seis meses desde a partida do Papa como se estivéssemos em um país normal, algo impensável até dois dias antes de sua chegada. Sua chegada aliviou a pressão. Vimos muçulmanos saindo de seus enclaves para se juntarem a seus irmãos e irmãs católicos no estádio, para participar da grande celebração. As pessoas iam e vinham. O Km 5 [marco 5] era considerado um local onde havia muitas armas e, portanto, não se podia entrar. Mas fui até lá com os cristãos para acompanhar o Papa, dizendo aos muçulmanos: “vamos caminhar juntos!”
O Papa veio de Roma para a República Centro-Africana, os cristãos de Bangui deixaram nossos bairros para ir ao encontro de nossos irmãos, caminhando pela paz. Bem, nós marchamos e continuamos a fazê-lo desde aquele dia. Um líder rebelde nos disse que deveríamos conversar sobre espiritualidade com os imãs. Os imãs organizaram uma grande reunião para pedir aos líderes rebeldes que depusessem suas armas e muita coisa mudou desde então. Isso também foi resultado da visita do Papa.
Os imãs realizaram um grande encontro para pedir aos líderes rebeldes que deponham as armas e isso mudou muito. Esse também foi o resultado da visita do Papa, que nos deu um empurrão, nos fez recomeçar e agora estamos vendo os resultados. Hoje as armas não circulam mais como antes.
Em sua opinião, quais foram os outros frutos desse evento?
Foram os encontros entre jovens muçulmanos e jovens cristãos. Encontros bastante regulares entre mulheres muçulmanas e mulheres cristãs, e entre nós, líderes. Há pouco tempo, em março, uma mesquita a 250 quilômetros daqui foi vandalizada. O imã, o pastor protestante e eu falamos ao coração de nossos fiéis para desarmá-los e convidá-los a cooperar, respeitar, valorizar e respeitar o local. Esse, em minha opinião, é o fruto dessa passagem. Agora também pedimos que a justiça seja feita. Isso significa que aqueles que perderam suas casas devem poder recuperá-las, o que significa que aqueles que moram na casa do vizinho há muito tempo devem ter a gentileza de sair. E nós, líderes religiosos, trabalhamos com o coração. Há alguns que saem para deixar a casa para os proprietários sem passar pelos tribunais ou pelo Estado. Portanto, acho que isso também é proveitoso. Agora os corações estão dispostos e podemos conversar, podemos imaginar um futuro comum.
Quando o senhor diz que eles saem de casa, é porque eles realmente a devolvem ao seu legítimo proprietário, certo?
Exatamente isso.
Em um nível mais pessoal, Vossa Eminência, quais são suas lembranças mais fortes e talvez mais vívidas daquele período?
A lembrança mais vívida é a de entrar no quilômetro 5 dois dias antes: era impossível atravessar o posto de controle. Eu estava lá. Vi com meus próprios olhos: o Papa escolheu ir em um veículo não blindado, mas em campo aberto. Todos sabiam que havia muitas armas no local. Francisco teve a coragem de ir até lá e vimos que o imã também concordou em ir no papamóvel. Essa é a imagem mais forte. Quando saí para ir ao estádio, vi muçulmanos saindo em massa, arriscando suas vidas. Foi sua fé que os levou a sair. Um imã nos disse: ‘O Papa não veio para vocês, cristãos, mas para nós, muçulmanos. Estávamos no enclave, estávamos na escravidão. Ele nos libertou!”
Eminência, uma última pergunta: o senhor se tornou inseparável do Imã… entre cristãos e muçulmanos e também com os protestantes. Vocês realizam iniciativas juntos quase diariamente. Esse é outro fruto. É claro que é o resultado de seu trabalho, mas também é o resultado da visita do Papa…
A visita do papa nos confortou, incentivou e apoiou nesse trabalho. E fomos nós três que pedimos a ele que viesse à República Centro-Africana. Acho que todos nós somos gratos a ele. Esse é o fruto de sua passagem.
O Jubileu de 2025. Como estão se preparando para ele?
O Jubileu de 2025 é um momento importante para a Igreja. Bem, já estão sendo criados grupos aqui para refletir, orar, reunir-se e também para ver como, localmente, viveremos esse momento. Este ano celebraremos 130 anos de evangelização na República Centro-Africana e, ao mesmo tempo, estaremos caminhando para 2025, que está logo ali, e estamos trabalhando em ambos. Portanto, acho que há muito entusiasmo. Eu estava com um grupo de jovens que se encontrava na igreja em massa e dissemos uns aos outros: este é um momento importante porque é um momento de graça, mas também é um momento complicado e elevado. Não podemos deixar passar esse momento favorável.

O cardeal Dieudonné Nzapalainga

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