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Quinta Pregação da Quaresma do cardeal Cantalamessa

Que, nesta Páscoa, o Senhor ressuscitado faça, ele mesmo, ressoar em nosso coração algum daqueles seus divinos “Eu Sou”, sobre os quais meditamos nesta Quaresma! Principalmente aquele que proclama a sua vitória pascal: “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, ainda que tenha morrido, ainda que tenha morrido, viverá. E todo aquele que vive e crê em mim, jamais morrerá”.
Fr. Raniero Card. Cantalamessa, OFMCap“EU SOU O CAMINHO, A VERDADE E A VIDA”Quinta Pregação da Quaresma de 2024
Em nosso itinerário em meio ao Quarto Evangelho, à descoberta de quem é Jesus para nós, chegamos à última etapa. Entramos naqueles que se costuma definir “os discursos de adeus” de Jesus e aos seus apóstolos. Desta vez, não tento nem mesmo fazer um resumo do contexto e trazer à luz as diversas unidades e subdivisões. Seria como querer traçar quadros e distinguir setores em uma lava fundida que desce da cratera. Por isso, vamos diretamente à palavra que queremos captar nesta meditação:
“Na casa de meu Pai há muitas moradas. Se não fosse assim, eu vos teria dito, porque vou preparar-vos um lugar. E depois que eu tiver ido preparar-vos um lugar, voltarei e vos levarei comigo, a fim de que, onde eu estiver, estejais vós também. E para onde eu vou, sabeis o caminho”. Tomé disse: “Senhor, não sabemos para onde vais. Como podemos saber o caminho?”. Jesus respondeu: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vai ao Pai senão por mim” (Jo 14,2-6).
“Eu sou o caminho, a verdade e a vida”: palavras que apenas uma pessoa no mundo poderia pronunciar e pro nunciou de fato. Cristo é o caminho e é a meta da viagem. Como Verbo eterno do Pai, é a verdade e a vida; como Verbo feito carne, é o caminho.
Tivemos ocasião para contemplar Cristo como Vida, comentando a sua palavra “Eu sou o pão da vida”, como Verdade comentando outra sua palavra “Eu sou a luz do mundo”. Concentremo-nos, por isso, em Cristo Caminho. Após ter contemplado Cristo como dom, temos a ocasião para contemplá-lo como modelo. “Como – escreve Kierkegaard – a Idade Média se desviara sempre mais ao acentuar o lado de Cristo como modelo, Lutero acentuou o outro lado, afirmando que ele é dom e que este dom, compete à fé aceita-lo”. Mas agora – acrescentava o mesmo autor – deve-se insistir também em Cristo modelo, se não quisermos que a doutrina sobre a fé se resuma a uma folha de figo que cubra as omissões mais anticristãs[1].
Jesus continua a dizer àqueles que encontra – isto é, a nós, neste momento – o que dizia aos apóstolos e àqueles que encontrava durante a sua vida terrena: “Vinde após mim”, ou mesmo ao simples “Segue-me!”. O seguimento (em grego, acolouthia) de Cristo, é um tema ilimitado. Sobre ele, foi escrito o livro mais amado e mais lido na Igreja, após a Bíblia, ou seja, a Imitação de Cristo. Limita-nos em dizer sobre ele o tanto que nos serve para passar a algumas aplicações práticas, sempre de caráter espiritual e pessoal, como nos determinamos nestas meditações.
O tema do seguimento de Cristo ocupa um lugar relevante no IV Evangelho. Seguir Jesus é quase sinônimo de crer nele. Crer, contudo, é uma atitude da mente e da vontade; a imagem do “caminho” e do “caminhar” evidencia um aspecto importante do crer, que é o “caminhar”, isto é, o dinamismo que deve caracterizar a vida do cristão e a repercussão que a fé deve ter na conduta de vida. O seguimento – ao contrário da fé e do amor – não indica apenas uma atitude particular da mente e do coração, mas delineia ao discípulo um programa de vida que implica um compartilhamento total: do modo de viver, do destino e da missão do Senhor.
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Com a relevância dada ao episódio da lavagem dos pés, João quis sublinhar um âmbito particular e prioritário do seguimento de Cristo, o do serviço (Jo 13,12-15). Mas não falarei do serviço. A este tema, dediquei a última pregação da Quaresma passada, e não é o caso de me repetir. Também porque creio ser o menos qualificado para falar de serviço, tendo exercido, em minha vida, quase que apenas “o serviço da Palavra” que, por mais importante que seja, é também relativamente fácil e mais gratificante do que muitos outros serviços na Igreja.
Gostaria mais de falar do que caracteriza o seguimento de Cristo e o distingue de todo outro tipo de seguimento. De um artista, de um filósofo, de um letrado, diz-se que se formou na escola deste ou daquele renomado mestre. Também de nós, religiosos, diz-se que nos formamos na escola, de Bento, de Domingos, de Francisco, de Inácio de Loyola e de outros homens ou mulheres. Mas, entre este seguimento e o de Cristo há uma diferença essencial. Ela é expressa, como melhor não se poderia fazer, pelas palavras do próprio João, no final do Prólogo do seu Evangelho: “A Lei foi dada por meio de Moisés; a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo” (Jo 1,17).
Para nós, religiosos, isto significa: a regra nos foi dada por meio do nosso Fundador ou Fundadora, mas a graça e a força para colocá-la em prática só nos vêm de Jesus Cristo. Para nós e para todos os cristãos, do mesmo modo, esta palavra significa também uma outra coisa, ainda mais radical: o Evangelho nos foi dado pelo Jesus terreno, mas a capacidade de observá-lo e pô-lo em prática só nos vem de Cristo ressuscitado, mediante o seu Espírito!
A respeito, Santo Tomás de Aquino escreveu palavras que, nos lábios de um doutor menos fidedigno do que ele, deixar-nos-iam perplexos. Comentando a frase paulina “a letra mata, mas o Espírito faz viver” (2Cor 3,6), ele escreve: “Por letra, entende-se toda lei escrita que permanece fora do homem, mesmo os preceitos morais contidos no Evangelho; por isso, também a letra do Evangelho mataria, se não fosse acrescentada a graça da fé que cura”[2].E pouco antes disse explicitamente que “a graça que nos cura” não é outra coisa senão “a mesma graça do Espírito Santo que dada aos crentes”[3]. Entendera-o por experiência pessoal Santo Agostinho e, por isso, inventou aquela sua extraordinária oração: “Senhor, tu me ordenas ser casto. Pois bem, dá-me o que me ordenas e de pois ordena-me o que quiseres”[4].
Eis porque boa parte dos discursos de Jesus na última ceia tem por assunto o Espírito Paráclito que ele enviaria sobre os apóstolos. Recordemos algumas das promessas a respeito:
Tenho ainda muitas coisas a vos dizer, mas não sois capazes de suportá-las agora. Quando ele vier, o Espírito da Verdade, então ele vos guiará a toda a verdade. Ele não falará de si mesmo, mas dirá tudo quanto tiver ouvido e vos anunciará as coisas que hão de vir. Ele me glorificará, porque receberá do que é meu, para vo-lo anunciar (16,12-14).
Se Jesus é “o Caminho” (em grego, odòs), o Espírito Santo é “o Guia” (em grego, odegòs, ou odegìa). Assim já o definia São Gregório de Nissa[5], e assim o invoca a Igreja Latina no Veni Creator. Os dois versículos “Ductore sic te praevio – vitemus omne noxium”, de fato significam, “assim guiados (ductor) por Vós evitaremos todo mal”.
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Entre as várias funções que Jesus atribui ao Paráclito nesta sua obra em nosso favor, aquela sobre a qual queremos nos deter é a de Sugeridor: “Ora, o Paráclito, o Espírito Santo que o Pai enviará em meu nome, ele vos recordará tudo o que eu vos tenho dito” (14,26). “Ele vos recordará”: a Vulgata Latina traduzia com ipse suggeret vobis: ele vos sugerirá.
O sugeridor, no teatro, está escondido dentro de uma cavidade e está invisível ao público: justamente como o Espírito Santo que ilumina tudo, permanecendo ele invisível e, por assim dizer, nos bastidores. O sugeridor pronuncia as palavras em voz baixa para não ser ouvido pelo público, e também o Espírito fala “em baixa voz”, suavemente. Contudo, diferente dos sugeridores humanos, ele não fala aos ouvidos, mas ao coração; não sugere mecanicamente as palavras do Evangelho, como de um roteiro, mas as explica, adapta, aplica às situações.
Estamos falando, naturalmente, das “inspirações do Espírito”, as chamadas “boas inspirações”. A fidelidade às inspirações é o caminho mais breve e seguro à santidade. Não sabemos em princípio qual é concretamente a santidade que Deus quer de cada um de nós; só Deus a conhece e no-la desvela à medida que o caminho prossegue. Não basta, por isso, ter um programa de perfeição bem claro, para assim realizá-lo progressivamente. Não há um modelo de perfeição idêntico para todos. Deus não faz os santos em série, não ama a clonagem. Cada santo é uma invenção inédita do Espírito. Deus pode pedir a alguém o contrário do que pede a outro. A consequência, daí, é que para alcançar a santidade, o homem não pode se limitar em seguir regras gerais que valem para todos. Deve também entender o que Deus lhe pede, e somente a ele.
Ora, o que Deus quer de diverso e particular de cada um, descobre-se mediante os acontecimentos da vida, a palavra da Escritura, a guia do diretor espiritual, mas o meio principal e ordinário são as inspirações da graça. Estas são solicitações interiores do Espírito no profundo do coração, perlas quais Deus não só dá a conhecer o que deseja de nós, mas dá a força necessária e, frequentemente, também a alegria para cumpri-lo, se a pessoa consentir.
Pensemos no que teria acontecido se Madre Teresa de Calcutá se obstinasse em observar as regras canônicas então vigentes nos institutos religiosos. Até a idade de 36 anos, ela era uma irmã de uma congregação religiosa, certamente fiel à sua vocação e dedicada ao seu trabalho, mas nada que fizesse prever nela algo de extraordinário. Foi durante uma viagem de trem de Calcutá a Darjeeling para seu retiro espiritual anual que aconteceu o fato que mudou a sua vida. O Espírito Santo lhe “sussurrou” ao ouvido do coração um claro convite: deixa a tua ordem, a tua vida precedente, e põe-te à minha disposição para uma obra que te indicarei. Entre as filhas de Madre Teresa, este dia – 10 de setembro de 1946 – é recordado com o nome de “Dia da Inspiração”.
Quando se trata de decisões de importância para nós mesmos ou para outros, a inspiração deve ser submetida e confirmada pela autoridade, ou pelo próprio padre espiritual. Assim fez, de fato, Madre Teresa. Nós nos expomos ao perigo se nos confiarmos unicamente à nossa própria inspiração pessoal.
As boas inspirações têm algo em comum com a inspiração bíblica, à parte, naturalmente, a autoridade e o alcance que são essencialmente diversos. “Deus disse a Abraão…”, “O Senhor falou a Moisés”: este falar do Senhor não era, do ponto de vista da fenomenologia, algo de diverso do que aconteceu nas inspirações da graça. A voz de Deus, também no Sinai, não ressoava ao exterior, mas dentro do coração sob forma de clareza, de impulsos, originados pelo Espírito Santo. Os dez mandamentos não foram inscritos pelo dedo de Deus em tábuas de pedra (é-nos difícil até de imaginá-lo!), mas no coração de Moisés, que depois inscreveu em tábuas de pedra. “Foi sob o impulso do Espírito Santo que alguns falaram da parte de Deus (2Pd 1,21); eram eles a falar, mas movidos pelo Espírito Santo; repetiam com a boca o que escutavam no coração. Deus, diz o profeta Jeremias, grava a sua lei nos corações (Jr 31,33).
Toda fidelidade a uma inspiração é recompensada por inspirações sempre mais frequentes e mais fortes. É como se a alma se exercitasse para chegar a uma percepção sempre mais clara da vontade de Deus e a uma maior facilidade ao cumpri-la.
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O problema mais delicado, acerca das inspirações, foi sempre o de discernir aquelas que vêm do Espírito de Deus daquelas que provêm do espírito do mundo, das próprias paixões, ou do espírito maligno. O tema do discernimento dos espíritos tem passado nos séculos por uma notável evolução. À origem, era concebido como o carisma que servia para distinguir – entre as palavras, orações e profecias pronunciadas na assembleia – quais provinham do Espírito de Deus e quais não. Em seu exercício comunitário, o carisma da profecia deve ser acompanhado, para o Apóstolo, por aquele do discernimento dos espíritos: “A outro, (é dada) a profecia; a outro, o discernimento dos espíritos” (1Cor 12,10).
O sentido originário do carisma, entendido por Paulo, parece ser muito preciso e limitado. Refere-se à recepção da própria profecia, a sua avaliação, da parte de um ou mais membros da assembleia, também eles dotados de espírito profético. Também isto, porém, não em base a uma análise racional, mas a uma inspiração do mesmo Espírito. O sentido de discernir (diakrisis) oscila, portanto, entre distinguir e interpretar: distinguir se quem falou foi o Espírito de Deus ou um espírito diverso, interpretar o que o Espírito quis dizer em uma situação concreta. A este mesmo dom do discernimento, refere-se a conhecida recomendação do Apóstolo: “Não apagueis o Espírito, não desprezeis as profecias, mas examinai tudo e guardai o que for bom. Afastai-vos de toda espécie de mal” (1Ts 5,19-22).
Se devemos levar em conta a experiência atual dos movimentos pentecostais e carismáticos, devemos pensar que este carisma consistisse na capacidade da assembleia, ou de alguns nela, de reagir ativamente a uma palavra profética, a uma citação bíblica, ou a uma oração, expressando – com a exclamação “confirmo!”, ou com outros pequenos sinais de cabeça e voz – aprovação pela palavra escutada, ou mostrando, ao contrário – com o silêncio e passando a outro – um juízo negativo. Desta forma, a verdadeira e a falsa profecia passam a ser julgadas “pelos frutos” que produzem ou não, como justamente recomendava Jesus (cf. Mt 7,16). Este significado originário do discernimento dos espíritos – aliás – poderia de grande atualidade ainda hoje em debates e reuniões, como aqueles que começamos a experimentar no diálogo sinodal.
Em época sucessiva, na espiritualidade tanto oriental quanto ocidental, o carisma do discernimento dos espíritos tem servido sobretudo para discernir as inspirações do discípulo da parte de um ancião (como no monaquismo) e, mais geralmente, para discernir as próprias inspirações. A evolução não é arbitrária; trata-se, de fato, do mesmo dom, mesmo se aplicado a sujeitos e em contextos diversos: o contexto comunitário no primeiro caso, o pessoal no segundo.
Há critérios de discernimento que poderíamos chamar objetivos. No campo doutrinal, eles se resumem para Paulo no reconhecimento de Cristo como Senhor: “Ninguém, falando pelo Espírito de Deus, vai dizer: ‘Jesus seja maldito’, como também ninguém será capaz de dizer: ‘Jesus é Senhor’, a não ser pelo Espírito Santo” (1Cor 12,3); para João, resumem-se na fé em Cristo e na sua encarnação:
Caríssimos, não creiais em qualquer espírito, mas examinai os espíritos para verdes se são de Deus, pois muitos falsos profetas vieram ao mundo. Nisto conheceis o Espírito de Deus: todo espírito que confessa Jesus Cristo vindo na carne, é de Deus. E todo espírito que não confessa Jesus, não é de Deus (1Jo 4,1-3).
No campo moral, um critério fundamental é dado pela coerência do Espírito de Deus consigo mesmo. Ele não pode pedir algo que seja contrário à vontade divina, tal como é expressa na Escritura, no ensinamento da Igreja e nos deveres do próprio estado. Uma inspiração divina jamais pedirá para cumprir atos que a Igreja considera imorais, por mais que a carne seja capaz de sugerir argumentos ilusórios contrários nestes casos; por exemplo, que Deus é amor e, por isso, tudo o que se faz por amor vem de Deus.
Contudo, às vezes estes critérios objetivos não bastam, porque a escolha não é entre o bem e o mal, mas é entre um bem e um outro bem, e se trata de ver qual é a coisa que Deus quer, em uma circunstância precisa. Foi sobretudo para responder a esta exigência que Santo Inácio de Loyola desenvolveu a sua doutrina sobre o discernimento.
Sinto quase vergonha de falar sobre este tema nesta sede…, mas vamos falar pelo menos alguma coisa. O santo nos convida a observar as intenções – ele as chama de “espíritos” – que estão por trás de uma escolha e as reações que ela provoca. Sabe-se que o que vem do Espírito de Deus traz consigo alegria, paz, tranquilidade, doçura, simplicidade, luz. O que provém do espírito do mal, ao contrário, traz consigo perturbação, agitação, inquietação, confusão, trevas. O Apóstolo o põe em evidência contrapondo os frutos da carne (inimizades, contenda, ciúmes, iras, intrigas, discórdias, invejas) e os frutos do Espírito, que são, ao contrário, amor, alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade, lealdade, mansidão, domínio próprio (Gl 5,22).
Na prática, as coisas, é verdade, são mais complexas. Uma inspiração pode vir de Deus e, apesar disso, causar uma grande perturbação. Mas isto não é devido à inspiração doce e pacífica, como tudo o que provém de Deus; antes, nasce da resistência à inspiração ou do fato de ela nos pedir algo que não estamos prontos a lhe dar. Se a inspiração for acolhida, o coração logo se encontrará em uma profunda paz. Deus recompensa cada pequena vitória neste campo, fazendo com que a alma sinta a sua aprovação, que é a alegria mais pura que existe no mundo.
Um campo no qual é importante praticar o discernimento – além daquele das intenções e das decisões – é o âmbito dos sentimentos. Nada é mais traiçoeiro do que o amor. A natureza é habilíssima em deixar passar, como proveniente do espírito, o que ao invés provém da carne. Neste campo, é mais do que nunca necessário levar em conta o conselho que o poeta latino Ovídio dava justamente a propósito dos males do amor: “Principiis obsta. Sero medicina paratur cum mala per longas convaluere moras: “Opõe-te aos começos. Tarde toma-se o remédio quando os males, pelos muitos adiamentos, ganharam força”[6].
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O fruto concreto desta meditação deve ser uma decisão renovada de nos confiarmos em tudo e por tudo à guia interior do Espírito Santo, como uma espécie de “direção espiritual”. Devemos todos nos abandonar ao Mestre interior que nos fala sem tumulto de palavras. Como bons atores, devemos ter o ouvido voltado, nas grandes e pequenas ocasiões, à voz deste “sugeridor” escondido, para interpretar fielmente a nossa parte na cena da vida. É o que se entende com a expressão “docilidade ao Espírito”.
É mais fácil do que pensamos, porque ele fala dentro de nós, ensina-nos tudo, instrui-nos sobre tudo. Às vezes, basta um simples olhar interior, um movimento do coração, um momento de recolhimento e oração. João escreve em sua Primeira Carta:
Quanto a vós, a unção que dele recebestes permanece convosco, e não tendes necessidade de que alguém vos ensine. A sua unção vos ensina tudo, e ela é verdadeira e não mentirosa (1Jo 2,27).
Sobre estas palavras, Santo Agostinho instaura um debate inusitado e vivaz com o Apóstolo. Em seu comentário à Primeira Carta de João, escreve:
Pergunto a João: “Aqueles aos quais dirigias estas palavras já tinham a unção… Por que então escreveste a eles esta carta? Por que instruí-los?”… Aqui há um grande mistério sobre o qual é preciso refletir, irmãos. O som das nossas palavras atinge os ouvidos, mas o verdadeiro mestre está dentro… Nós podemos exortar com o som da voz, mas, se dentro não está quem ensina, trata-se de um barulho inútil[7].
Se acolher as inspirações é importante para todo o cristão, é vital para quem tem funções de governo na Igreja. Só assim se permite ao Espírito de Cristo guiar a sua Igreja mediante seus representantes humanos. Em um navio, não é necessário que todos os passageiros estejam com os ouvidos grudados no rádio de bordo, para receber sinais sobre a rota, sobre eventuais icebergs e sobre as condições do tempo, mas é indispensável que os responsáveis de bordo estejam. De uma “inspiração divina”, acolhida corajosamente pelo Papa São João XXIII, nasceu o Concílio Vaticano II. Da mesma forma, depois dele, nasceram outros gestos proféticos, que aqueles que vierem depois de nós perceberão.
Que, nesta Páscoa, o Senhor ressuscitado faça, ele mesmo, ressoar em nosso coração algum daqueles seus divinos “Eu Sou”, sobre os quais meditamos nesta Quaresma! Principalmente aquele que proclama a sua vitória pascal: “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, ainda que tenha morrido, ainda que tenha morrido, viverá. E todo aquele que vive e crê em mim, jamais morrerá (11,23-26).
Santo Padre, irmãos e irmãs, Feliz Páscoa!
__________________________
Tradução Fr. Ricardo Farias, ofmcap
[1] Cf. Diário, X 1 A 154.[2] Cf. Tomás de Aquino, Summa theologiae, I-IIae, q. 106, a. 2.[3] Cf. Ibid., q. 106, a. 1; cf. Agostinho, De Spiritu et littera, 21, 36.[4] Cf. Agostinho, Confissões, X, 29.[5] Cf. Gregório de Nissa, De fide (PG, 45, 141C).[6] Cf. Ovídio, Remedia amoris, V,91.[7] Cf. Agostinho, Tratado sobre a Primeia Epístola de João, 3,13.

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O Papa: muitos conflitos abertos, não ceder à lógica das armas

Francisco divulgou uma carta por ocasião dos 80 anos do voto de Pio XII e da cidade de Roma a Maria Salus Populi Romani durante a fúria da II Guerra Mundial. O Pontífice pede que o aniversário seja uma oportunidade para “meditar em torno do terrível flagelo da guerra”. Olhando para a Ucrânia, Oriente Médio, Sudão e Mianmar, exorta a ouvir os “gritos de terror e de sofrimento” que questionam a consciência de todos e a “trabalhar pela paz na Europa e no mundo”.
Mariangela Jaguraba- Vatican News
O Papa Francisco enviou uma carta ao vice-gerente da Diocese de Roma, dom Baldassarre Reina, por ocasião dos 80 anos do voto de Pio XII e da cidade de Roma ao ícone de Nossa Senhora conhecido como “Salus Populi Romani” durante a II Guerra Mundial.
O Pontífice une-se espiritualmente a toda a comunidade diocesana que celebra pela primeira vez a memória litúrgica da Salus Populi Romani, e recorda o voto que o povo de Roma e seu Pastor, Papa Pio XII, fez a Nossa Senhora em 4 de junho de 1944 para implorar a salvação da cidade, quando o confronto direto entre o exército alemão e os aliados anglo-americanos estava prestes a acontecer”, escreve o Papa no texto.
“A devoção ao antigo ícone conservado na Basílica de Santa Maria Maior está viva há séculos no coração dos romanos, que recorriam a ele para fazer súplicas e invocações, especialmente durante pragas, desastres naturais e guerras”, escreve ainda Francisco. “Os eventos marcantes da vida religiosa e civil de Roma eram registrados em frente a essa imagem. Portanto, não é de surpreender que o povo romano desejou confiar-se mais uma vez a Maria Salus Populi Romani enquanto a Urbe vivia o pesadelo da devastação nazista”, ressalta ainda o Papa.

Pio XII com os cidadãos romanos após o bombardeio do bairro de São Lourenço

Não ceder à lógica das armas
De acordo com Francisco, “oitenta anos depois, a lembrança desse acontecimento tão cheio de significado quer ser uma ocasião para rezar por aqueles que perderam a vida na II Guerra Mundial e para fazer uma meditação renovada sobre o tremendo flagelo da guerra”.
Muitos conflitos em diferentes partes do mundo ainda estão abertos hoje. Penso em particular na martirizada Ucrânia, na Palestina e Israel, no Sudão e Mianmar, onde as armas ainda fazem barulho e mais sangue humano continua sendo derramado.

“Esses são dramas que afetam inúmeras vítimas inocentes, cujos gritos de terror e sofrimento questionam a consciência de todos: não podemos e não devemos ceder à lógica das armas!”

O apelo de Paulo VI à ONU
O Pontífice recorda que “vinte anos após o fim da II Guerra Mundial, em 1965, o Papa São Paulo VI, falando na ONU, perguntou: ‘Será que o mundo chegará a mudar a mentalidade particularista e bélica que até agora teceu grande parte de sua história?'” Segundo Francisco, “essa pergunta, que ainda aguarda uma resposta, estimula todos a trabalhar concretamente pela paz na Europa e em todo o mundo”.

“A paz é um dom de Deus que também deve encontrar hoje corações dispostos a acolhê-lo e trabalhar para serem construtores da reconciliação e testemunhas da esperança.”

Ser construtor de paz
Francisco espera “que as iniciativas promovidas para comemorar o voto popular à Mãe de Deus, nos quatro lugares que foram protagonistas daquele acontecimento, possam reavivar nos romanos a intenção de serem construtores de uma verdadeira paz em todos os lugares, relançando a fraternidade como condição essencial para recompor conflitos e hostilidade”. “Pode ser construtor de paz”, ressalta o Papa, “quem a possui dentro de si e, com coragem e mansidão, se compromete em criar vínculos, em estabelecer relações entre as pessoas, em apaziguar as tensões na família, no trabalho, na escola, entre os amigos”.
O Pontífice conclui a carta, pedindo a Nossa Senhora Medianeira para que “obtenha para toda a humanidade o dom da concórdia e da paz” e confia “todos os habitantes de Roma, especialmente os idosos, os doentes, as pessoas sozinhas e em dificuldade, à intercessão materna da Salus Populi Romani”.

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Indonésia. Ilha de Flores ainda é uma “terra prometida” de vocações

“Em junho e julho estão programadas várias ordenações diaconais entre os vários institutos missionários. No domingo, 2 de junho, 48 foram ordenados diáconos Verbitas, que serão seguidos por outros 8 diáconos Carmelitas no dia 7 de junho, e 27 interdiocesanos (Dioceses de Maumere, Ende, Ruteng, Larantuka e Denpasar) no domingo, 9 de junho. A esses se seguirão as ordenações de cinco diáconos Camilianos no próximo dia 14 de julho, na festa de nosso fundador, São Camilo de Lellis”, conta Pe. Galvani
Vatican News

 

Em 1924 os vigários e prefeitos apostólicos encontraram-se pela primeira vez, para definir uma orientação comum sobre diversas questões da vida da Igreja e sobre a relação com as …

“Nesta época de final de ano letivo, estamos obtendo bons resultados vocacionais. Nós, Camilianos, tentamos nos manter em forma tanto quanto possível com muitas pequenas coisas boas para fazer, não apenas no campo vocacional, mas também com nossas iniciativas sociais e de caridade.”
É o que conta à agência missionária Fides o padre Luigi Galvani, pioneiro na Diocese de Maumere, na Indonésia, onde os Missionários Camilianos estão presentes em três dioceses com 4 seminários, dois centros sociais onde coordenam um programa de nutrição para 160 crianças pobres, apoio à distância para cerca de 20 estudantes merecedores, um projeto de “casas especiais” para libertar os doentes mentais de situações de opressão e, por fim, um modesto projeto de produção de água mineral e do sorvete “São Camilo”.
Ordenações diaconais entre os vários institutos missionários
“Em junho e julho – explica ele – estão programadas várias ordenações diaconais entre os vários institutos missionários. No domingo, 2 de junho, 48 foram ordenados diáconos Verbitas, que serão seguidos por outros 8 diáconos Carmelitas no dia 7 de junho, e 27 interdiocesanos (Dioceses de Maumere, Ende, Ruteng, Larantuka e Denpasar) no domingo, 9 de junho. A esses se seguirão as ordenações de cinco diáconos Camilianos no próximo dia 14 de julho, na festa de nosso fundador, São Camilo de Lellis”.
A mais católica das 17.000 ilhas do arquipélago indonésio

Em algumas áreas do país, que o Papa visitará em setembro, membros do clero local e de ordens religiosas masculinas e femininas moram por alguns dias em famílias católicas, …

“Nos próximos meses, haverá também as profissões religiosas de numerosos noviços e noviças dos vários institutos masculinos e femininos presentes na Diocese de Maumere, que, no momento, atingiram o número de 62 comunidades religiosas”.
“Todos esses resultados vocacionais encorajadores – conclui o missionário – certamente recompensam o empenho dos vários promotores, mas também são um testemunho da fé e do espírito missionário de centenas e centenas de famílias na ilha de Flores, que continua sendo a mais católica das 17.000 ilhas do arquipélago indonésio. Talvez seja também por isso que Flores é chamada de “terra prometida” de vocações.
(com Fides)

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África Central, quando uma Porta Santa se abriu para o mundo

O Jubileu Extraordinário da Misericórdia, em 2015, foi aberto em um lugar sem precedentes, longe do coração cristão do mundo, a Basílica de São Pedro, mas dentro do coração do Papa Francisco, em Bangui. O cardeal Dieudonné Nzapalainga, então arcebispo da capital da África Central, revive aquele dia memorável e o significado benéfico que a visita do Pontífice produziu ao longo do tempo.
Maria Milvia Morciano e Jean Charles Putzolu – Vatican News
É tarde e a noite se prepara lentamente para chegar, tingindo o céu de rosa e dourado. A porta da Catedral de Notre-Dame em Bangui se abre, empurrada por duas mãos firmes. A figura de Francisco está de pé, vigorosa. Muitos anos se passaram desde aquele 29 de novembro de 2015, o primeiro dia do Advento e a data de início do Jubileu Extraordinário da Misericórdia, que foi inaugurado, antecipadamente, em um lugar igualmente extraordinário, na capital da África Central. Pela primeira vez na história, a abertura da Porta Santa não se realiza na Basílica de São Pedro, no túmulo do Apóstolo, no centro do mundo cristão, mas em um lugar remoto, para muitos desconhecido.
Capital espiritual
A África Central é um dos países mais sangrentos e divididos do mundo. O Papa o escolheu justamente por esse motivo, para levar misericórdia e uma mensagem de paz a uma “terra que está sofrendo há vários anos com a guerra e o ódio, a incompreensão e a falta de paz. Mas nessa terra sofrida há também todos os países que estão passando através da cruz da guerra. Bangui se torna a capital espiritual da oração pela misericórdia do Pai. Todos nós pedimos paz, misericórdia, reconciliação, perdão, amor. Por Bangui, por toda a República Centro-Africana, por todo o mundo, pelos países que estão sofrendo com a guerra, pedimos paz!”, disse o Papa na praça da igreja, depois de sair de um papamóvel, desprovido de qualquer proteção contra possíveis perigos, onde o imã também concordou em se sentar.
Um gesto universal compreendido por todos
Uma tradição antiga é transferida para um país jovem. O significado de abrir a Porta Santa e cruzar o limiar está enraizado em um simbolismo ancestral que, em Bangui, se ramifica e dá novos frutos. Ele está revestido de futuro. O gesto do Papa Francisco foi revolucionário porque, em um lugar fechado, cheio de barreiras, ele abre uma porta para a esperança, convida as pessoas a entrarem para encontrar misericórdia e paz, para encontrar Cristo e serem transformadas. Ele traduz de forma cristã uma metáfora compreensível para todos, em qualquer lugar do mundo, de qualquer tradição, religião, experiência e história. Todos entendem que se trata de um rito de passagem fundamental e sagrado.
A linha de fronteira, o limes latim, ponto final, fechamento, é transformada em limen, limiar, abertura. Talvez não seja coincidência o fato de duas palavras opostas conterem a mesma raiz, mas é interessante lembrar o fato de que, na linguagem eclesiástica, a “visitatio ad limina apostolorum” é a visita dos peregrinos aos túmulos dos apóstolos Pedro e Paulo, que remonta aos primeiros séculos da Igreja, mais tarde estendida aos bispos. Tudo fala de Jubileu.
Portas Santas em toda parte
Naquele ano de Misericórdia, muitas Portas Santas foram abertas em todo o mundo, quase um sistema solar composto por milhares de estrelas brilhantes espalhadas pela Terra, mesmo nos lugares mais remotos. Foi uma grande oportunidade, um presente dado a todos, mesmo àqueles que, por vários motivos, não podiam se locomover e viajar. Foi um jubileu extraordinário que pôde ser vivenciado em todas as igrejas locais, permitindo que aqueles que quisessem vivenciar plenamente o evento, fazer a peregrinação e atravessar a Porta da Misericórdia em sua própria diocese.
Uma esperança que vem de Roma
O cardeal Dieudonné Nzapalainga, então arcebispo de Bangui, é um dos intérpretes nodais de seu país. Sua história é de fé e de uma árdua “luta pela paz”, lembrando o título de seu livro na versão italiana, publicado pela Livraria Editora Vaticana em 2022. O cardeal centro-africano compartilhou com a mídia vaticana, aos microfones de Jean Charles Putzolu, a memória daqueles dias e as consequências benéficas da visita do Papa à África Central.
Gostaria de levá-los de volta ao dia 29 de novembro de 2015, o primeiro domingo do Advento, quando o Papa Francisco abriu a Porta Santa do Jubileu da Misericórdia. Foi em Bangui, na República Centro-Africana, portanto, em seu país: uma tradição muito antiga chegando a um país jovem. Em sua opinião, qual foi o significado desse gesto para todos os centro-africanos?
É um gesto único na história não apenas da Igreja universal, mas também da nossa Igreja.
Porque nós, centro-africanos, diante da violência, do sofrimento e da morte, encontrando-nos vivendo em um estado de absurdo, sentimos a esperança que veio de Roma por meio do homem de Deus, o Papa, que veio para aplacar, para trazer paz, tranquilidade e perdão, para trazer reconciliação, convidando nós, centro-africanos, a abrir as portas de nossos corações, cheios de ódio, rancor e vingança, para que pudéssemos nos enfrentar. É por isso que ele mesmo disse para depormos nossas armas: “leve a justiça, leve o amor”. Acredito que seu gesto será sempre lembrado aqui na República Centro-Africana. Muçulmanos, protestantes, católicos, todos nós somos unânimes em dizer que sua chegada foi salutar.
E o Papa de fato chegou. Ela se lembrou dessa mensagem, desse chamado para depor as armas. Havia uma enorme tensão até quase dois dias antes de sua chegada a Bangui. Houve mais tensão desde então? Essa mensagem foi ouvida? A mensagem do Papa foi ouvida e atendida? As armas ficaram em silêncio?
Acho que a mensagem foi ouvida. Passamos seis meses desde a partida do Papa como se estivéssemos em um país normal, algo impensável até dois dias antes de sua chegada. Sua chegada aliviou a pressão. Vimos muçulmanos saindo de seus enclaves para se juntarem a seus irmãos e irmãs católicos no estádio, para participar da grande celebração. As pessoas iam e vinham. O Km 5 [marco 5] era considerado um local onde havia muitas armas e, portanto, não se podia entrar. Mas fui até lá com os cristãos para acompanhar o Papa, dizendo aos muçulmanos: “vamos caminhar juntos!”
O Papa veio de Roma para a República Centro-Africana, os cristãos de Bangui deixaram nossos bairros para ir ao encontro de nossos irmãos, caminhando pela paz. Bem, nós marchamos e continuamos a fazê-lo desde aquele dia. Um líder rebelde nos disse que deveríamos conversar sobre espiritualidade com os imãs. Os imãs organizaram uma grande reunião para pedir aos líderes rebeldes que depusessem suas armas e muita coisa mudou desde então. Isso também foi resultado da visita do Papa.
Os imãs realizaram um grande encontro para pedir aos líderes rebeldes que deponham as armas e isso mudou muito. Esse também foi o resultado da visita do Papa, que nos deu um empurrão, nos fez recomeçar e agora estamos vendo os resultados. Hoje as armas não circulam mais como antes.
Em sua opinião, quais foram os outros frutos desse evento?
Foram os encontros entre jovens muçulmanos e jovens cristãos. Encontros bastante regulares entre mulheres muçulmanas e mulheres cristãs, e entre nós, líderes. Há pouco tempo, em março, uma mesquita a 250 quilômetros daqui foi vandalizada. O imã, o pastor protestante e eu falamos ao coração de nossos fiéis para desarmá-los e convidá-los a cooperar, respeitar, valorizar e respeitar o local. Esse, em minha opinião, é o fruto dessa passagem. Agora também pedimos que a justiça seja feita. Isso significa que aqueles que perderam suas casas devem poder recuperá-las, o que significa que aqueles que moram na casa do vizinho há muito tempo devem ter a gentileza de sair. E nós, líderes religiosos, trabalhamos com o coração. Há alguns que saem para deixar a casa para os proprietários sem passar pelos tribunais ou pelo Estado. Portanto, acho que isso também é proveitoso. Agora os corações estão dispostos e podemos conversar, podemos imaginar um futuro comum.
Quando o senhor diz que eles saem de casa, é porque eles realmente a devolvem ao seu legítimo proprietário, certo?
Exatamente isso.
Em um nível mais pessoal, Vossa Eminência, quais são suas lembranças mais fortes e talvez mais vívidas daquele período?
A lembrança mais vívida é a de entrar no quilômetro 5 dois dias antes: era impossível atravessar o posto de controle. Eu estava lá. Vi com meus próprios olhos: o Papa escolheu ir em um veículo não blindado, mas em campo aberto. Todos sabiam que havia muitas armas no local. Francisco teve a coragem de ir até lá e vimos que o imã também concordou em ir no papamóvel. Essa é a imagem mais forte. Quando saí para ir ao estádio, vi muçulmanos saindo em massa, arriscando suas vidas. Foi sua fé que os levou a sair. Um imã nos disse: ‘O Papa não veio para vocês, cristãos, mas para nós, muçulmanos. Estávamos no enclave, estávamos na escravidão. Ele nos libertou!”
Eminência, uma última pergunta: o senhor se tornou inseparável do Imã… entre cristãos e muçulmanos e também com os protestantes. Vocês realizam iniciativas juntos quase diariamente. Esse é outro fruto. É claro que é o resultado de seu trabalho, mas também é o resultado da visita do Papa…
A visita do papa nos confortou, incentivou e apoiou nesse trabalho. E fomos nós três que pedimos a ele que viesse à República Centro-Africana. Acho que todos nós somos gratos a ele. Esse é o fruto de sua passagem.
O Jubileu de 2025. Como estão se preparando para ele?
O Jubileu de 2025 é um momento importante para a Igreja. Bem, já estão sendo criados grupos aqui para refletir, orar, reunir-se e também para ver como, localmente, viveremos esse momento. Este ano celebraremos 130 anos de evangelização na República Centro-Africana e, ao mesmo tempo, estaremos caminhando para 2025, que está logo ali, e estamos trabalhando em ambos. Portanto, acho que há muito entusiasmo. Eu estava com um grupo de jovens que se encontrava na igreja em massa e dissemos uns aos outros: este é um momento importante porque é um momento de graça, mas também é um momento complicado e elevado. Não podemos deixar passar esse momento favorável.

O cardeal Dieudonné Nzapalainga

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