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Sri Lanka, uma viagem à ilha que anseia por dignidade e futuro

Primeira parte de um itinerário entre os Centros coordenados pelo MAGIS (Movimento e Ação dos Jesuítas em prol do Desenvolvimento) para apoiar os setores mais pobres e explorados da população. O presidente: “Atividades planejadas em conjunto”. O provincial: em um país arruinado, esperamos uma nova liderança que implemente as aspirações do povo e abandone a corrupção.
Antonella Palermo – Colombo (Sri Lanka)
Fortalecer o sistema educacional, antes de tudo, para construir o bem-estar integral da pessoa e construir uma nova liderança atenta às necessidades reais de um povo que anseia por dignidade, oportunidades de trabalho e consciência de si mesmo. É isso que a Fundação MAGIS (Movimento e Ação dos Jesuítas em prol do Desenvolvimento), uma obra da Província Euro-Mediterrânea da Companhia de Jesus que coordena e promove atividades missionárias e cooperação internacional com 47 projetos em 22 países através do compromisso e da ação de jesuítas e leigos, se propõe a realizar no Sri Lanka.
Uma ilha ferida 
O primeiro destino da viagem foi a capital comercial da ilha, Colombo, uma cidade de arquitetura multifacetada resultante de seu longo passado colonial britânico, que abriga o único aeroporto do estado e fica ao longo da costa oeste, no Oceano Índico. A base para os deslocamentos internos – que teriam levado ao extremo norte, próximo à Índia – foi Negombo, a cerca de quarenta quilômetros de distância, na arquidiocese de Colombo, onde está localizada a Cúria Provincial dos jesuítas, na mesma área da igreja de São Sebastião, que ficou tragicamente famosa pelos atentados à bomba durante a Páscoa, que há cinco anos causaram a morte de mais de cem pessoas. Durante toda a estadia, o presidente do MAGIS, professor Ambrogio Bongiovanni, que está envolvido no subcontinente indiano há mais de trinta anos, acompanhou nossa equipe.

Ambrogio Bongiovanni cumprimenta uma mãe com seu bebê nos arredores de Colombo

Planejar juntos
“A especificidade do nosso trabalho está no fato de que as atividades são planejadas em conjunto, trabalhamos por uma visão comum, e não com ações lançadas de cima para baixo”, explica Bongiovanni, professor da Faculdade de Missiologia da Pontifícia Universidade Gregoriana e diretor, na mesma universidade, do Centro de Estudos Inter-religiosos. Ele fala da eficácia desse estilo que anima e orienta as iniciativas de ajuda humanitária, particularmente no Sul do mundo, nos campos da cultura, dos direitos fundamentais, da paz e da saúde. “Uma experiência muito positiva porque você realmente se sente envolvido, há uma verdadeira corresponsabilidade entre as pessoas”, explica ele.
É tangível a beleza do relacionamento que se consegue estabelecer com a pluralidade de culturas presentes nessas regiões, onde mais do que nunca ressoa forte a “necessidade de uma ação transformadora da missão”. Nos dias da viagem, chegou também a notícia da aprovação, por parte da Agência Italiana para a Cooperação Internacional do Ministério das Relações Exteriores da Itália, de um projeto que o MAGIS implementará e que compromete mais de um milhão de euros para promover no Sri Lanka não só a educação, sobre a qual amadureceu um estudo mais do que válido, mas também a ecologia integral, tão cara ao Papa Francisco, e a reconciliação.
São três eixos emblematicamente interconectados em uma realidade em que os traços da guerra civil entre tâmeis e cingaleses ainda são evidentes, e em que um dos desafios prioritários é justamente o de amenizar as feridas, favorecendo intercâmbios, colaboração e superação de preconceitos entre minorias religiosas e entre diferentes grupos étnicos.

Em entrevista ao Vatican News, o cardeal Malcolm Ranjith, arcebispo de Colombo, expressa gratidão ao Papa Francisco pela doação de 100 mil euros para apoiar cerca de 400 famílias …

Formar gerações para uma nova liderança
“É um novo passo de colaboração para ajudar as pessoas mais desfavorecidas. Tenho muita esperança”, comenta o padre Angelo Sujeewa Pathirana SJ, o provincial jesuíta que está nos guiou na região: “A cooperação é muito importante, como foi na época do tsunami”. Relembra o tsunami do Oceano Índico, um dos desastres naturais mais catastróficos, que causou mais de 230.000 mortes.
Uma humanidade a ser resgatada, sim, mas acima de tudo, hoje, a ser acompanhada para que possa adquirir o empoderamento que libertará de uma pobreza esmagadora para muitos. Basta dizer que o aumento de 18% no imposto sobre produtos industrializados está deixando as famílias desesperadas, que reclamam que os custos se tornaram “insustentáveis e inacessíveis”.
Um dos setores em que os investimentos deveriam ser maiores está sofrendo as consequências: a educação. As importações de artigos de papelaria estão caindo, as livrarias históricas estão demitindo funcionários. O preço do papel aumentou 300% e o transporte sofre com a mesma tendência. “É uma questão de transmitir ferramentas básicas de conhecimento, especialmente um bom inglês, de oferecer também uma maneira de compartilhar os valores cristãos”, diz o padre Angelo, mas também está em jogo o desenvolvimento de uma “visão política, de uma postura atenta aos males da sociedade”. É uma questão de preparar as novas gerações para enfrentar os problemas com um novo espírito: “Também tentamos nos referir ao método YWL, que visa, em particular, oferecer às jovens do ensino médio experiências para capacitá-las também como líderes, na conscientização de seus direitos”, ressalta o religioso.

Bandeiras do Sri Lanka nas estradas de Colombo no Dia da Independência do país (4 de fevereiro)

O país sofre com a fome
“Estamos bastante revoltados com a falta de mudanças políticas pelas quais aguardamos com esperança”, observa o provincial. Seu pensamento está voltado para as eleições presidenciais programadas para este ano, embora nos últimos dias o gabinete do presidente Ranil Wickremesinghe tenha divulgado uma nota dizendo que elas devem ser realizadas somente em 2025. “Estamos interessados em ver como será a nova liderança, qual será sua pauta, se implementará as aspirações das pessoas que estão passando por uma grave crise econômica, se promoverá a superação da corrupção e da má administração no estado.
Esperamos que haja uma mudança para que os políticos não olhem para seus próprios interesses, mas para os do país”, adverte o jesuíta. São palavras que fazem eco às proferidas pelo cardeal arcebispo Malcolm Ranjith em 4 de fevereiro, no dia da República. Na igreja suburbana de All Saints, o cardeal questionou qual seria a essência da celebração da liberdade quando a nação foi atingida por uma turbulência econômica e um impasse político. “As pessoas estão com fome”, exclamou dom Malcolm. O Sri Lanka declarou falência em abril de 2022, acumulando dívidas de mais de 83 bilhões de dólares. A renúncia de Rajapakse como presidente fez com que o atual governo interino fizesse um empréstimo de 2,9 bilhões de dólares do Fundo Monetário Internacional, que agora parece, depois que a inflação chegou a 95%, mostrar sinais de recuperação para o país. Atualmente, o Sri Lanka tem o registro de pagamento mais baixo de toda a região da Ásia-Pacífico e da Oceania e, desde 2022, o país tem sofrido um êxodo maciço de trabalhadores qualificados e não qualificados como resultado do colapso da moeda.

O Centro Shanti na periferia de Colombo
Dehiwala é um dos bairros mais pobres da capital. O “Centro de Animação Comunitária Shanti “, uma associação sem fins lucrativos, fundado em 1977 pelo missionário jesuíta padre Michael Catalano, originário de Nápoles, funciona nesse território. O anfitrião é o padre Ranjiit Yawu SJ, diretor, e Sujeewa, sua assistente, professora e conselheira, ela é budista e trabalha ali desde 1999. “Cuidamos de 56 crianças. Com o programa pós-escola, envolvemos cerca de 400. Elas se sentem muito confortáveis aqui, o ambiente é muito amigável. Os pequenos aqui são muito felizes”, diz a assistente. “As pessoas daqui são muito pobres. Ganham de 10 a 15 mil rúpias (nem mesmo 50 euros por mês) e vivem em casas muito pequenas. Os homens raramente são vistos: estão na prisão, mortos, desaparecidos, usam álcool, se desviam do caminho. Às vezes, até mesmo a figura da mãe está desaparecida, que pode ter ido para o exterior em busca de novas oportunidades de trabalho. Quando isso acontece, os filhos ficam sozinhos, o mais velho cuidando do mais novo”.

O interior do escritório do Centro Shanti, com uma foto do fundador

O Centro Shanti oferece programas de capacitação, formação de habilidades e educação para crianças e adultos, com foco nas mulheres, vítimas de guerras e desastres naturais. “Brincar e aprender” é o lema com o qual a instituição busca estimular as habilidades artísticas das crianças inscritas. Há também um programa de proteção para as mães. Tanto a professora quanto o jesuíta também relatam casos de abuso sofridos por menores que, na maioria das vezes, são forçados a ficar em espaços domésticos excessivamente confinados, onde o já frágil equilíbrio familiar corre o risco de ser destruído.

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O Papa: muitos conflitos abertos, não ceder à lógica das armas

Francisco divulgou uma carta por ocasião dos 80 anos do voto de Pio XII e da cidade de Roma a Maria Salus Populi Romani durante a fúria da II Guerra Mundial. O Pontífice pede que o aniversário seja uma oportunidade para “meditar em torno do terrível flagelo da guerra”. Olhando para a Ucrânia, Oriente Médio, Sudão e Mianmar, exorta a ouvir os “gritos de terror e de sofrimento” que questionam a consciência de todos e a “trabalhar pela paz na Europa e no mundo”.
Mariangela Jaguraba- Vatican News
O Papa Francisco enviou uma carta ao vice-gerente da Diocese de Roma, dom Baldassarre Reina, por ocasião dos 80 anos do voto de Pio XII e da cidade de Roma ao ícone de Nossa Senhora conhecido como “Salus Populi Romani” durante a II Guerra Mundial.
O Pontífice une-se espiritualmente a toda a comunidade diocesana que celebra pela primeira vez a memória litúrgica da Salus Populi Romani, e recorda o voto que o povo de Roma e seu Pastor, Papa Pio XII, fez a Nossa Senhora em 4 de junho de 1944 para implorar a salvação da cidade, quando o confronto direto entre o exército alemão e os aliados anglo-americanos estava prestes a acontecer”, escreve o Papa no texto.
“A devoção ao antigo ícone conservado na Basílica de Santa Maria Maior está viva há séculos no coração dos romanos, que recorriam a ele para fazer súplicas e invocações, especialmente durante pragas, desastres naturais e guerras”, escreve ainda Francisco. “Os eventos marcantes da vida religiosa e civil de Roma eram registrados em frente a essa imagem. Portanto, não é de surpreender que o povo romano desejou confiar-se mais uma vez a Maria Salus Populi Romani enquanto a Urbe vivia o pesadelo da devastação nazista”, ressalta ainda o Papa.

Pio XII com os cidadãos romanos após o bombardeio do bairro de São Lourenço

Não ceder à lógica das armas
De acordo com Francisco, “oitenta anos depois, a lembrança desse acontecimento tão cheio de significado quer ser uma ocasião para rezar por aqueles que perderam a vida na II Guerra Mundial e para fazer uma meditação renovada sobre o tremendo flagelo da guerra”.
Muitos conflitos em diferentes partes do mundo ainda estão abertos hoje. Penso em particular na martirizada Ucrânia, na Palestina e Israel, no Sudão e Mianmar, onde as armas ainda fazem barulho e mais sangue humano continua sendo derramado.

“Esses são dramas que afetam inúmeras vítimas inocentes, cujos gritos de terror e sofrimento questionam a consciência de todos: não podemos e não devemos ceder à lógica das armas!”

O apelo de Paulo VI à ONU
O Pontífice recorda que “vinte anos após o fim da II Guerra Mundial, em 1965, o Papa São Paulo VI, falando na ONU, perguntou: ‘Será que o mundo chegará a mudar a mentalidade particularista e bélica que até agora teceu grande parte de sua história?'” Segundo Francisco, “essa pergunta, que ainda aguarda uma resposta, estimula todos a trabalhar concretamente pela paz na Europa e em todo o mundo”.

“A paz é um dom de Deus que também deve encontrar hoje corações dispostos a acolhê-lo e trabalhar para serem construtores da reconciliação e testemunhas da esperança.”

Ser construtor de paz
Francisco espera “que as iniciativas promovidas para comemorar o voto popular à Mãe de Deus, nos quatro lugares que foram protagonistas daquele acontecimento, possam reavivar nos romanos a intenção de serem construtores de uma verdadeira paz em todos os lugares, relançando a fraternidade como condição essencial para recompor conflitos e hostilidade”. “Pode ser construtor de paz”, ressalta o Papa, “quem a possui dentro de si e, com coragem e mansidão, se compromete em criar vínculos, em estabelecer relações entre as pessoas, em apaziguar as tensões na família, no trabalho, na escola, entre os amigos”.
O Pontífice conclui a carta, pedindo a Nossa Senhora Medianeira para que “obtenha para toda a humanidade o dom da concórdia e da paz” e confia “todos os habitantes de Roma, especialmente os idosos, os doentes, as pessoas sozinhas e em dificuldade, à intercessão materna da Salus Populi Romani”.

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Indonésia. Ilha de Flores ainda é uma “terra prometida” de vocações

“Em junho e julho estão programadas várias ordenações diaconais entre os vários institutos missionários. No domingo, 2 de junho, 48 foram ordenados diáconos Verbitas, que serão seguidos por outros 8 diáconos Carmelitas no dia 7 de junho, e 27 interdiocesanos (Dioceses de Maumere, Ende, Ruteng, Larantuka e Denpasar) no domingo, 9 de junho. A esses se seguirão as ordenações de cinco diáconos Camilianos no próximo dia 14 de julho, na festa de nosso fundador, São Camilo de Lellis”, conta Pe. Galvani
Vatican News

 

Em 1924 os vigários e prefeitos apostólicos encontraram-se pela primeira vez, para definir uma orientação comum sobre diversas questões da vida da Igreja e sobre a relação com as …

“Nesta época de final de ano letivo, estamos obtendo bons resultados vocacionais. Nós, Camilianos, tentamos nos manter em forma tanto quanto possível com muitas pequenas coisas boas para fazer, não apenas no campo vocacional, mas também com nossas iniciativas sociais e de caridade.”
É o que conta à agência missionária Fides o padre Luigi Galvani, pioneiro na Diocese de Maumere, na Indonésia, onde os Missionários Camilianos estão presentes em três dioceses com 4 seminários, dois centros sociais onde coordenam um programa de nutrição para 160 crianças pobres, apoio à distância para cerca de 20 estudantes merecedores, um projeto de “casas especiais” para libertar os doentes mentais de situações de opressão e, por fim, um modesto projeto de produção de água mineral e do sorvete “São Camilo”.
Ordenações diaconais entre os vários institutos missionários
“Em junho e julho – explica ele – estão programadas várias ordenações diaconais entre os vários institutos missionários. No domingo, 2 de junho, 48 foram ordenados diáconos Verbitas, que serão seguidos por outros 8 diáconos Carmelitas no dia 7 de junho, e 27 interdiocesanos (Dioceses de Maumere, Ende, Ruteng, Larantuka e Denpasar) no domingo, 9 de junho. A esses se seguirão as ordenações de cinco diáconos Camilianos no próximo dia 14 de julho, na festa de nosso fundador, São Camilo de Lellis”.
A mais católica das 17.000 ilhas do arquipélago indonésio

Em algumas áreas do país, que o Papa visitará em setembro, membros do clero local e de ordens religiosas masculinas e femininas moram por alguns dias em famílias católicas, …

“Nos próximos meses, haverá também as profissões religiosas de numerosos noviços e noviças dos vários institutos masculinos e femininos presentes na Diocese de Maumere, que, no momento, atingiram o número de 62 comunidades religiosas”.
“Todos esses resultados vocacionais encorajadores – conclui o missionário – certamente recompensam o empenho dos vários promotores, mas também são um testemunho da fé e do espírito missionário de centenas e centenas de famílias na ilha de Flores, que continua sendo a mais católica das 17.000 ilhas do arquipélago indonésio. Talvez seja também por isso que Flores é chamada de “terra prometida” de vocações.
(com Fides)

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África Central, quando uma Porta Santa se abriu para o mundo

O Jubileu Extraordinário da Misericórdia, em 2015, foi aberto em um lugar sem precedentes, longe do coração cristão do mundo, a Basílica de São Pedro, mas dentro do coração do Papa Francisco, em Bangui. O cardeal Dieudonné Nzapalainga, então arcebispo da capital da África Central, revive aquele dia memorável e o significado benéfico que a visita do Pontífice produziu ao longo do tempo.
Maria Milvia Morciano e Jean Charles Putzolu – Vatican News
É tarde e a noite se prepara lentamente para chegar, tingindo o céu de rosa e dourado. A porta da Catedral de Notre-Dame em Bangui se abre, empurrada por duas mãos firmes. A figura de Francisco está de pé, vigorosa. Muitos anos se passaram desde aquele 29 de novembro de 2015, o primeiro dia do Advento e a data de início do Jubileu Extraordinário da Misericórdia, que foi inaugurado, antecipadamente, em um lugar igualmente extraordinário, na capital da África Central. Pela primeira vez na história, a abertura da Porta Santa não se realiza na Basílica de São Pedro, no túmulo do Apóstolo, no centro do mundo cristão, mas em um lugar remoto, para muitos desconhecido.
Capital espiritual
A África Central é um dos países mais sangrentos e divididos do mundo. O Papa o escolheu justamente por esse motivo, para levar misericórdia e uma mensagem de paz a uma “terra que está sofrendo há vários anos com a guerra e o ódio, a incompreensão e a falta de paz. Mas nessa terra sofrida há também todos os países que estão passando através da cruz da guerra. Bangui se torna a capital espiritual da oração pela misericórdia do Pai. Todos nós pedimos paz, misericórdia, reconciliação, perdão, amor. Por Bangui, por toda a República Centro-Africana, por todo o mundo, pelos países que estão sofrendo com a guerra, pedimos paz!”, disse o Papa na praça da igreja, depois de sair de um papamóvel, desprovido de qualquer proteção contra possíveis perigos, onde o imã também concordou em se sentar.
Um gesto universal compreendido por todos
Uma tradição antiga é transferida para um país jovem. O significado de abrir a Porta Santa e cruzar o limiar está enraizado em um simbolismo ancestral que, em Bangui, se ramifica e dá novos frutos. Ele está revestido de futuro. O gesto do Papa Francisco foi revolucionário porque, em um lugar fechado, cheio de barreiras, ele abre uma porta para a esperança, convida as pessoas a entrarem para encontrar misericórdia e paz, para encontrar Cristo e serem transformadas. Ele traduz de forma cristã uma metáfora compreensível para todos, em qualquer lugar do mundo, de qualquer tradição, religião, experiência e história. Todos entendem que se trata de um rito de passagem fundamental e sagrado.
A linha de fronteira, o limes latim, ponto final, fechamento, é transformada em limen, limiar, abertura. Talvez não seja coincidência o fato de duas palavras opostas conterem a mesma raiz, mas é interessante lembrar o fato de que, na linguagem eclesiástica, a “visitatio ad limina apostolorum” é a visita dos peregrinos aos túmulos dos apóstolos Pedro e Paulo, que remonta aos primeiros séculos da Igreja, mais tarde estendida aos bispos. Tudo fala de Jubileu.
Portas Santas em toda parte
Naquele ano de Misericórdia, muitas Portas Santas foram abertas em todo o mundo, quase um sistema solar composto por milhares de estrelas brilhantes espalhadas pela Terra, mesmo nos lugares mais remotos. Foi uma grande oportunidade, um presente dado a todos, mesmo àqueles que, por vários motivos, não podiam se locomover e viajar. Foi um jubileu extraordinário que pôde ser vivenciado em todas as igrejas locais, permitindo que aqueles que quisessem vivenciar plenamente o evento, fazer a peregrinação e atravessar a Porta da Misericórdia em sua própria diocese.
Uma esperança que vem de Roma
O cardeal Dieudonné Nzapalainga, então arcebispo de Bangui, é um dos intérpretes nodais de seu país. Sua história é de fé e de uma árdua “luta pela paz”, lembrando o título de seu livro na versão italiana, publicado pela Livraria Editora Vaticana em 2022. O cardeal centro-africano compartilhou com a mídia vaticana, aos microfones de Jean Charles Putzolu, a memória daqueles dias e as consequências benéficas da visita do Papa à África Central.
Gostaria de levá-los de volta ao dia 29 de novembro de 2015, o primeiro domingo do Advento, quando o Papa Francisco abriu a Porta Santa do Jubileu da Misericórdia. Foi em Bangui, na República Centro-Africana, portanto, em seu país: uma tradição muito antiga chegando a um país jovem. Em sua opinião, qual foi o significado desse gesto para todos os centro-africanos?
É um gesto único na história não apenas da Igreja universal, mas também da nossa Igreja.
Porque nós, centro-africanos, diante da violência, do sofrimento e da morte, encontrando-nos vivendo em um estado de absurdo, sentimos a esperança que veio de Roma por meio do homem de Deus, o Papa, que veio para aplacar, para trazer paz, tranquilidade e perdão, para trazer reconciliação, convidando nós, centro-africanos, a abrir as portas de nossos corações, cheios de ódio, rancor e vingança, para que pudéssemos nos enfrentar. É por isso que ele mesmo disse para depormos nossas armas: “leve a justiça, leve o amor”. Acredito que seu gesto será sempre lembrado aqui na República Centro-Africana. Muçulmanos, protestantes, católicos, todos nós somos unânimes em dizer que sua chegada foi salutar.
E o Papa de fato chegou. Ela se lembrou dessa mensagem, desse chamado para depor as armas. Havia uma enorme tensão até quase dois dias antes de sua chegada a Bangui. Houve mais tensão desde então? Essa mensagem foi ouvida? A mensagem do Papa foi ouvida e atendida? As armas ficaram em silêncio?
Acho que a mensagem foi ouvida. Passamos seis meses desde a partida do Papa como se estivéssemos em um país normal, algo impensável até dois dias antes de sua chegada. Sua chegada aliviou a pressão. Vimos muçulmanos saindo de seus enclaves para se juntarem a seus irmãos e irmãs católicos no estádio, para participar da grande celebração. As pessoas iam e vinham. O Km 5 [marco 5] era considerado um local onde havia muitas armas e, portanto, não se podia entrar. Mas fui até lá com os cristãos para acompanhar o Papa, dizendo aos muçulmanos: “vamos caminhar juntos!”
O Papa veio de Roma para a República Centro-Africana, os cristãos de Bangui deixaram nossos bairros para ir ao encontro de nossos irmãos, caminhando pela paz. Bem, nós marchamos e continuamos a fazê-lo desde aquele dia. Um líder rebelde nos disse que deveríamos conversar sobre espiritualidade com os imãs. Os imãs organizaram uma grande reunião para pedir aos líderes rebeldes que depusessem suas armas e muita coisa mudou desde então. Isso também foi resultado da visita do Papa.
Os imãs realizaram um grande encontro para pedir aos líderes rebeldes que deponham as armas e isso mudou muito. Esse também foi o resultado da visita do Papa, que nos deu um empurrão, nos fez recomeçar e agora estamos vendo os resultados. Hoje as armas não circulam mais como antes.
Em sua opinião, quais foram os outros frutos desse evento?
Foram os encontros entre jovens muçulmanos e jovens cristãos. Encontros bastante regulares entre mulheres muçulmanas e mulheres cristãs, e entre nós, líderes. Há pouco tempo, em março, uma mesquita a 250 quilômetros daqui foi vandalizada. O imã, o pastor protestante e eu falamos ao coração de nossos fiéis para desarmá-los e convidá-los a cooperar, respeitar, valorizar e respeitar o local. Esse, em minha opinião, é o fruto dessa passagem. Agora também pedimos que a justiça seja feita. Isso significa que aqueles que perderam suas casas devem poder recuperá-las, o que significa que aqueles que moram na casa do vizinho há muito tempo devem ter a gentileza de sair. E nós, líderes religiosos, trabalhamos com o coração. Há alguns que saem para deixar a casa para os proprietários sem passar pelos tribunais ou pelo Estado. Portanto, acho que isso também é proveitoso. Agora os corações estão dispostos e podemos conversar, podemos imaginar um futuro comum.
Quando o senhor diz que eles saem de casa, é porque eles realmente a devolvem ao seu legítimo proprietário, certo?
Exatamente isso.
Em um nível mais pessoal, Vossa Eminência, quais são suas lembranças mais fortes e talvez mais vívidas daquele período?
A lembrança mais vívida é a de entrar no quilômetro 5 dois dias antes: era impossível atravessar o posto de controle. Eu estava lá. Vi com meus próprios olhos: o Papa escolheu ir em um veículo não blindado, mas em campo aberto. Todos sabiam que havia muitas armas no local. Francisco teve a coragem de ir até lá e vimos que o imã também concordou em ir no papamóvel. Essa é a imagem mais forte. Quando saí para ir ao estádio, vi muçulmanos saindo em massa, arriscando suas vidas. Foi sua fé que os levou a sair. Um imã nos disse: ‘O Papa não veio para vocês, cristãos, mas para nós, muçulmanos. Estávamos no enclave, estávamos na escravidão. Ele nos libertou!”
Eminência, uma última pergunta: o senhor se tornou inseparável do Imã… entre cristãos e muçulmanos e também com os protestantes. Vocês realizam iniciativas juntos quase diariamente. Esse é outro fruto. É claro que é o resultado de seu trabalho, mas também é o resultado da visita do Papa…
A visita do papa nos confortou, incentivou e apoiou nesse trabalho. E fomos nós três que pedimos a ele que viesse à República Centro-Africana. Acho que todos nós somos gratos a ele. Esse é o fruto de sua passagem.
O Jubileu de 2025. Como estão se preparando para ele?
O Jubileu de 2025 é um momento importante para a Igreja. Bem, já estão sendo criados grupos aqui para refletir, orar, reunir-se e também para ver como, localmente, viveremos esse momento. Este ano celebraremos 130 anos de evangelização na República Centro-Africana e, ao mesmo tempo, estaremos caminhando para 2025, que está logo ali, e estamos trabalhando em ambos. Portanto, acho que há muito entusiasmo. Eu estava com um grupo de jovens que se encontrava na igreja em massa e dissemos uns aos outros: este é um momento importante porque é um momento de graça, mas também é um momento complicado e elevado. Não podemos deixar passar esse momento favorável.

O cardeal Dieudonné Nzapalainga

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